Título: EMPRESAS DÃO NOVO SALTO NA ROTA PARA O EXTERIOR
Autor: Patricia Duarte
Fonte: O Globo, 19/03/2006, Economia, p. 41

De olho em custos menores, companhias aplicaram US$1,19 bi lá fora só em janeiro: 47,3% do total de todo 2005

BRASÍLIA. A contínua valorização do real frente às moedas estrangeiras, o comércio mundial em expansão e a consolidação da participação no mercado doméstico estão levando as empresas brasileiras a investirem mais em negócios e fábricas no exterior. Dados do Banco Central mostram que, só em janeiro passado, as companhias que buscam tornar-se multinacionais verde-amarelas aplicaram US$1,19 bilhão líquido lá fora ¿ o equivalente a 47,3% do que foi aplicado em negócios estrangeiros em todo o ano passado. A cifra é a maior desde agosto de 2004 (US$6,9 bilhões), mas o número daquele mês é distorcido por causa da fusão AmBev-Interbrew (de US$6 bi). Excluindo esse mês, o número é o maior em dez anos.

Para o chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, existe maior desejo das empresas nacionais de se internacionalizarem, aspecto positivo para a economia detectado pelo banco. O objetivo dessas empresas é diminuir o custo das operações, sobretudo as exportadoras, que pagam caro para ter representantes lá fora. Também é uma oportunidade de fincar raízes em outros mercados, ampliando o número de clientes. Em geral, não há redução da produção em solo brasileiro.

¿ Nossos maiores clientes são internacionais. Temos de estar perto deles. Neste momento de câmbio baixo, ficam mais atrativos os projetos externos ¿ diz Décio da Silva, presidente da fabricante de motores Weg, acrescentando que, em cinco anos, a fatia das unidades de fora na produção deve dobrar, para 20% do total.

A empresa, com sede em Santa Catarina e quatro fábricas em outros países, planeja investir R$175 milhões em produção este ano, sendo R$34 milhões nas unidades estrangeiras, sobretudo no México (aproveitando a área de livre comércio com os EUA) e na China. O país, por sinal, é um dos principais focos das companhias brasileiras, que enxergam enorme mercado consumidor potencial, mão-de-obra barata e boa localização, como ponto inicial para exportar, sobretudo para a Ásia.

Azaléia fecha fábrica no Sul e terceiriza produção na China

O gerente-executivo da unidade de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco, chama a atenção para o fato de o setor produtivo estar mais amadurecido, pronto para fazer planos de expansão de longo prazo e encarar o mundo como espaço de negócios.

Setores como o siderúrgico e de aviação já têm importantes bases construídas em outros países. Agora empresas de outros ramos e portes estão seguindo esses passos. O câmbio valorizado é importante na equação, pois permite que investimentos em moeda estrangeira consumam menos reais.

Embora de forma branda, esse movimento também pode representar efeitos negativos do câmbio forte. Algumas empresas nacionais optam por expandir no exterior ao mesmo tempo em que reduzem sua atividade no país, ou seja, transferem produção. Um exemplo é a Azaléia, fabricante de calçados, setor que vem perdendo competitividade internacional. A companhia fechou uma fábrica no Sul para terceirizar a produção na China, voltada para exportação aos EUA e à Europa. Segundo a empresa, são produzidos 60 mil pares naquele país, pequena parte dos 36 milhões feitos por ano no Brasil em 40 fábricas.

O consultor e professor da Unicamp Luciano Coutinho, por sua vez, diz que um cliente seu do setor de autopeças estuda fechar uma fábrica em São Paulo para se mudar para a Argentina, a fim de abastecer uma montadora no Rio Grande do Sul. A saída, avaliam especialistas como Antônio Corrêa de Lacerda (PUC-SP), é fortalecer o câmbio novamente, além de melhorar a tributação.

¿ Enquanto prevalecer o câmbio baixo, teremos também essa internacionalização negativa ¿ afirma ele.

Para fortalecer as empresas nacionais lá fora, o BNDES criou uma linha de crédito para quem quer ganhar o mundo. Mas, para obter o dinheiro, a empresa tem de assumir compromissos no Brasil, como aumentar exportações. O custo do empréstimo, diz o diretor de Indústria e Comércio Exterior do banco, Armando Mariante, é atrelado ao câmbio. Aberta em 2005, a linha foi usada por três empresas e há dez na fila, de agronegócios, cosméticos e software:

¿ Queremos que as empresas consolidem presença em ambos os mercados.

Empresas de menor porte apostam em EUA e Paraguai

A Friboi é uma das que conseguiram o crédito do BNDES (R$80 milhões), para comprar a Swift Armour, do setor de carnes da Argentina, em 2005. O diretor financeiro, Sérgio Longo, diz que a decisão de expandir fronteiras veio da complementariedade operacional e sinergia.

Com cerca de R$10 milhões do BNDES, a CPM (ramo de software) e a cooperativa agroindustrial paranaense Lar também ousaram. A primeira abriu escritório nos EUA e a outra comprou armazém no Paraguai, para melhorar a distribuição.

COLABOROU Henrique Gomes Batista