Título: BANHO DE SANGUE
Autor: Helena Chagas
Fonte: O Globo, 20/03/2006, O País, p. 4

A oposição acha que só tem um jeito de queimar os 20 pontos (19 no Datafolha) que separam Geraldo Alckmin do adversário: desconstruir Lula e seu governo. Coincidência ou não, o tucano ganhou seis pontos na semana em que Palocci ficou no alvo e o PFL jogou na propaganda da TV um pacote de comerciais anti-Lula. Mas o presidente ainda tem 42% nas pesquisas.

Lula venceria hoje a eleição no primeiro turno sem Garotinho no páreo. E a participação do ex-governador ainda é uma incógnita.

A pouco mais de seis meses das eleições, o que se avizinha é um verdadeiro banho de sangue. O Planalto também está pegando em armas e reage com os meios e modos de quem tem na mão a máquina e os instrumentos do poder.

O que será de nós, eleitores, em meio a esse tiroteio, ninguém sabe. Por enquanto, é importante observar uma série de variáveis:

1. Confusão e indefinição no PMDB radicaliza campanha.

Escolhido ontem na consulta do PMDB que não valeu legalmente, Garotinho dificilmente atravessará o corredor polonês da convenção. Quem consegue melar uma prévia, ainda que no tapetão, consegue melar a convenção. Sem o PMDB na jogada, ou pelo menos com grandes chances de ele não estar na jogada, dificilmente haverá segundo turno, conforme confirma o Datafolha: sem candidato do PMDB, Lula teria hoje 52% dos votos válidos. Isso quer dizer menos tempo e condições mais adversas para Alckmin virar o jogo. O que, por sua vez, levará a oposição a jogar mais pesado ainda.

2. De onde vem e até onde vai o crescimento de Alckmin.

Especialistas em pesquisas acham que o crescimento de Alckmin decorre sobretudo de seu lançamento pelo PSDB. Foi a primeira pesquisa depois disso e já se esperava que, quando o partido finalmente escolhesse o candidato, pondo fim às divergências internas, seria criado um fato positivo para o PSDB. Alckmin herda parte dos votos de José Serra, aparece nos meios de comunicação como candidato oficial e cresce. Mas terá que aproveitar a onda para consolidar uma curva de ascensão, coisa que só ficará clara nas próximas pesquisas. Ingredientes como o tiro ao alvo em Palocci e a propaganda negativa do PFL, porém, podem ter ajudado, à medida que arranham o governo.

3. O fator Palocci.

Nem no governo e nem na oposição acredita-se que haverá um terremoto na economia caso o ministro da Fazenda tenha que deixar o cargo. Mas Lula acha que é o verdadeiro alvo das pressões pela derrubada de Palocci e destinatário de seu desgaste final. Por isso, saiu na defesa pública do ministro. Não quer que Palocci seja mais um daqueles dominós derrubados na propaganda do PFL na TV, junto com José Dirceu, Okamotto, Gushiken e outros.

4. A avaliação do governo se mantém, mas a de Lula cai: agora, todos de olho na economia.

De fevereiro para cá, como mostra o Datafolha, caiu de 53% para 44% o índice dos que acham o desempenho de Lula bom/ótimo. A aprovação ao governo, porém, manteve-se estável: foi de 37% para 38%. A tradução da equação mostra que o presidente precisa estancar a queda pessoal. E que a forma de fazer isso é mostrar serviço. Além de uma dose maciça de programas sociais e investimentos na veia, a esperança do Planalto está nos números do crescimento da economia no primeiro trimestre do ano. Parece que dá sinais de vida.

5. Os dois lados têm munição, mas quem ataca ganha eleição?

Jogo pesado raramente ganha eleição, dizem os políticos. Quase sempre o beneficiário é um terceiro que fez cara de bonzinho e deixou os outros se matarem na campanha. Como essa eleição pode não ter terceiros, fica a dúvida. Pelo sim, pelo não, a oposição manterá Alckmin longe das acusações. Outros serão incumbidos de atirar. Lula também fará a linha Lulinha Paz e Amor. No discurso.

6. Uma campanha de entranhas expostas e menos marketing.

Tudo indica que será uma campanha de candidatos totalmente desnudados. Ninguém conseguirá esconder nada, ainda que não gostemos do que vamos ver. Não há marketing que resolva isso.

7. Empobrecimento do debate.

Os problemas do país ficam em segundo plano quando a estratégia é a destruição mútua.

8. E depois?

Quem sair vivo de 2006 verá um governo com enormes dificuldades para formar maioria política e governar.