Título: No Ceará, programas à luz do dia
Autor: Ricardo Galhardo
Fonte: O Globo, 20/03/2006, O País, p. 9

Nas ruas de Fortaleza, menores de 9 anos se prostituem

FORTALEZA. O sol ainda está a pino na capital cearense, e adolescentes caminham sozinhas ou em duplas pela calçada mal-trilhada da avenida Padaria Espiritual, corredor de tráfego que liga áreas nobres de Fortaleza ao distrito industrial de Maracanaú, na região metropolitana. Elas não estão lá à-toa. Procuram clientes para programas sexuais. No final da tarde, são dezenas: maiores e menores de idade.

Por ser um dos principais destinos turísticos do país, as zonas mais conhecidas de prostituição em Fortaleza são a Praia de Iracema e a Avenida Beira Mar, cartão postal e onde concentra-se a rede hoteleira. Mas não é apenas o turismo que sazonalmente incentiva esse mercado. Na baixa estação, em pontos mais periféricos, são os próprios cearenses os clientes do sexo. Com idade média de 12 a 24 anos, mas encontrando-se até de 9 anos, as meninas costumam referir-se aos clientes como coroas.

A prostituição e a exploração sexual de menores em particular são temas indigestos às autoridades. Para Renato Roseno, coordenador do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca), Ong que trabalha pela proteção jurídico-social das vítimas, o combate não pode se limitar à repressão e punição do explorador. As políticas públicas devem ter também o viés de resgatar e restaurar a dignidade das meninas.

- Não se conseguirá superar a exploração sexual com ações isoladas - diz Roseno.

Além de políticas públicas, o combate à exploração sexual infanto-juvenil demanda investimento. Roseno denuncia que até novembro do ano passado o governo do estado não havia executado um único centavo da rubrica "combate específico à exploração sexual infanto-juvenil e contra o tráfico de mulheres", no valor de R$886,6 mil, do orçamento da Secretaria de Segurança Pública.

Apesar de acentuada na capital, a exploração sexual de menores ocorre com visibilidade em 50 dos 184 municípios cearenses, segundo a deputada estadual Tânia Gurgel (PSDB), relatora da CPI da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes da Assembléia Legislativa, encerrada em dezembro do ano passado.

- Se Fortaleza que é a capital tem dificuldade de dar retaguarda e esse atendimento, no interior é pior. Se nada for feito, daqui a cinco anos a situação estará insustentável - diz a deputada.

A prefeitura de Fortaleza começa a despertar para o assunto. A prefeita Luizianne Lins (PT), que assumiu no ano passado, assinou um convênio com a Secretaria Especial de Direitos Humanos para capacitação e integração da rede de atendimento às vítimas. O convênio é de R$350 mil para este ano.