Título: REAL VALORIZADO CONTRIBUI PARA CONTER INFLAÇÃO
Autor: Regina Alvarez
Fonte: O Globo, 20/03/2006, Economia, p. 19

Governo defende o sistema de câmbio flutuante e não intervém, apesar do impacto negativo sobre exportações

BRASÍLIA. A valorização do real frente ao dólar já dura vinte meses e tem produzido efeitos importantes na economia. A queda livre do dólar está prejudicando alguns setores da indústria nacional que exportam, mas tem contribuído fortemente para o controle da inflação. E é este fator que parece estar pesando mais na decisão do governo de continuar defendendo o sistema de câmbio flutuante.

- No geral e no longo prazo, os efeitos do câmbio flutuante sobre a economia são positivos. Os desalinhamentos, se ocorrerem, serão temporários - afirmou ao GLOBO o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Murilo Portugal.

Preços compensaram defasagem cambial

Na avaliação de Portugal, o câmbio flutuante garante mais investimentos de longo prazo e aumenta a capacidade de substituir importações.

- Tudo isso produz uma mudança estrutural na economia - afirma.

A economista Alessandra Ribeiro, da Consultoria Tendências, explica que os setores que contaram com aumento dos preços de suas mercadorias exportadas conseguiram contrapor o efeito da apreciação cambial, ao longo de 2005. É o caso das indústrias extrativa mineral (o minério de ferro subiu 70% só em 2005), siderúrgica e de refino de petróleo.

Já os que não puderam ajustar preços estão sendo afetados mais fortemente. Entre eles, estão os setores de calçados, têxtil, papel e celulose, que perderam rentabilidade.

- As importações estão reagindo, enquanto as exportações, na margem, já mostram acomodação. Estamos estimando um saldo comercial de US$41 bilhões este ano - observa ela.

O câmbio também tem contribuído para reduzir a dívida pública dos estados e da própria União. Em 2005, a apreciação do real foi responsável por 0,65 ponto percentual a menos no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Seu impacto nos índices de preços por atacado (IPAs), que integram os índices gerais de preços (IGPs) foi ainda maior.

- O câmbio contribuiu fortemente para a queda da inflação em 2005 e vai ter impacto sobre os preços controlados. Esperamos que a inflação dos preços administrados (energia, telefone etc.) fique em torno de 4,5% em 2006, a metade dos 9% de 2005 - informa a economista Maria Andreia Parente Lameiras, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Juros pesaram menos na queda dos preços

Os preços administrados não são sensíveis aos efeitos da política monetária restritiva, que atua apenas sobre a chamada inflação de demanda - contida pela queda do consumo. Mas, segundo especialistas, o câmbio está tendo um papel mais relevante no combate à inflação do que os juros altos.

O efeito do câmbio sobre o IGP-DI, que corrige as dívidas dos estados junto à União, também levou à redução do déficit nominal dos estados em 2005 de 1,92% para 0,28% do Produto Interno Bruto (PIB). Neutralizou, em parte, os efeitos dos juros sobre a dívida da União, que encerrou o ano no valor de 51,6% do PIB.