Título: Solteirices
Autor:
Fonte: O Globo, 21/03/2006, O GLOBO, p. 2

Garotinho ganhou a consulta interna do PMDB mas dificilmente levará a candidatura presidencial. Quando o STF confirmar, como todos esperam, que a regra da verticalização valerá na eleição deste ano, é provável que boa parte das seções estaduais peemedebistas que participaram da consulta dê meia volta, preferindo ficar fora da disputa presidencial e com liberdade para fazer as alianças locais mais convenientes.

Estranhos são os critérios de ponderação dos votos adotados pelo PMDB. Deram a vitória a um candidato que obteve, nominalmente, 38,81% dos votos contra outro que obteve 61,19%. Mas este é um problema deles, e Rigotto, tendo participado da reunião que adotou tais regras, aceitou a ponderação que deu a vitória a Garotinho.

Mais estranho é que tantos partidos de caráter nacional estejam marchando para uma existência regional, abdicando de participar da disputa eleitoral mais importante do país, a da Presidência da República. Embora Rigotto esteja prometendo apoiar Garotinho para garantir a apresentação de candidatura própria do PMDB, com a verticalização é altamente provável que na convenção nem seu nome nem qualquer outro seja homologado. E não por obra exclusiva dos que preferem a reeleição de Lula mas de um conjunto de líderes regionais que enxerga apenas a sobrevivência e as disputas pelo mando local.

Nunca, como nesta eleição, teremos tantos partidos optando pela chamada solteirice na eleição presidencial. Desesperados para cumprir a cláusula de barreira e emparedados pela verticalização, devem marchar nesta direção o PTB, o PP e talvez o PL, partidos médios que saem da crise muito estigmatizados e desafiados a garantir a sobrevivência. Com uma boa bancada, poderão ter influência num futuro governo, qualquer que seja ele.

Partidos que sempre foram aliados do PT como o PCdoB e o PSB também já trabalham com a hipótese de não se coligarem com o aliado de sempre, apoiando a recandidatura de Lula apenas informalmente. Muitos outros partidos menores farão a mesma coisa. Neste grupo, apenas o PSOL deve lançar a candidatura de Heloisa Helena, o PPS, a de Roberto Freire (que ainda não é consensual) e o PDT, talvez, a de Cristovam Buarque.

Em se tratando de partidos pequenos, há um atenuante para a prioridade dada à sobrevivência. Mas um partido grande e tradicional como o PMDB, quando fica fora da eleição presidencial, está dizendo que não tem projeto nacional e só existe em função dos pólos de poder regional. Enquanto isso, PT e PSDB se consolidam como os partidos nacionais que contam.

Para Garotinho começa agora uma outra caminhada difícil. As realidades regionais vão jogar alguns caciques, mesmo de oposição, em seu caminho. E os que apóiam Lula vão jogar pesado. Com Alckmin crescendo e Lula se estabilizando, tudo farão para evitar a candidatura que pode levar para o segundo turno uma eleição que Lula ainda pode, hoje, ganhar no primeiro turno. Mas poderá menos, à medida que o tucano crescer e Garotinho estiver no jogo.

Destino de Serra

Quem conhece José Serra sabe que ele jamais entraria na disputa pelo governo do estado de São Paulo apenas para ajudar na decolagem da candidatura presidencial de Geraldo Alckmin. Mas com a pesquisa Datafolha mostrando que ele ganharia no primeiro turno ¿ por 58% se o adversário petista fosse o senador Mercadante e por 50% se fosse a ex-prefeita Marta Suplicy ¿ acabam-se os argumentos. Ou quase. Resta apenas o fato de ele ter prometido ficar no cargo até o final do mandato, para o qual tucanos e pefelistas já arranjaram desculpas e discursos: como governador, poderia fazer muito mais pela capital. Em São Paulo é que tucanos e petistas vão travar a batalha principal da guerra sangrenta pela Presidência da República.

O PFL, quando fala em adiar para abril a decisão sobre a aliança com o PSDB, está de olho na decisão de Serra. Continua desejando muito aquela prefeitura de orçamento gordo e grande capacidade de projeção de seu ocupante. Geraldo Alckmin está pedindo pressa. Mas agora é também o calendário que aperta Serra. Dentro de nove dias acaba-se o prazo para que ele deixe a prefeitura caso decida ser candidato a governador. Em seu partido, crescem as apostas em sua saída. No PFL, a torcida.