Título: GASTOS SOCIAIS CAÍRAM 2,7% NO GOVERNO LULA
Autor: Ricardo Galhardo
Fonte: O Globo, 22/03/2006, O País, p. 8

Estudo mostra que só Bolsa Família cresceu, entre nove itens, em comparação com os últimos dois anos da gestão de FH

SÃO PAULO. Estudo realizado pelo economista Márcio Pochmann, professor da Unicamp, mostra que os gastos sociais do governo caíram 2,7% nos primeiros três anos da gestão Luiz Inácio Lula da Silva, em comparação com os últimos dois anos do governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

Segundo o estudo de Pochmann, o gasto médio per capita em 2001 e 2002 foi de R$1.533,77, contra R$1.491,95 entre 2003 e 2005. O estudo não contabiliza anos anteriores devido à falta de informações até 2001.

Dos nove itens do Orçamento selecionados pelo professor, apenas a assistência social, que inclui o Bolsa Família, teve aumento (11,11%) em relação ao período anterior (de R$86,19 por pessoa para R$95,77).

Aperto fiscal teve impacto no resultado do estudo

Segundo Pochmann, o aperto fiscal promovido por Lula em 2003 teve forte impacto no resultado do levantamento. Naquele ano, o governo teve um gasto social de R$1.414 por pessoa. Mas, mesmo excluindo 2003, houve queda de 0,19% na comparação geral entre os dois governos.

De acordo com o professor da Unicamp, a culpa é do modelo econômico que drena dinheiro para o sistema financeiro e, na outra ponta, assiste os mais pobres com programas como o Bolsa Família e o aumento do salário-mínimo.

- Paradoxalmente, temos hoje uma aliança entre os mais ricos e os mais pobres. É um modelo econômico que repassa 50% do PIB para 21 mil clãs familiares que detêm 70% da dívida pública, mas conta com apoio político dos 15% mais pobres, assistidos pelo Bolsa Família, e dos que estão ingressando no mercado ganhando salário-mínimo - disse Pochmann, que foi secretário municipal de Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade de São Paulo na gestão da petista Marta Suplicy (2001 a 2004).

O resultado é o achatamento da renda da classe média assalariada. De acordo com o estudo, o salário mínimo cresceu 27,8% e os gastos sociais 29,8% nos últimos dez anos, enquanto o rendimento médio dos assalariados caiu 16,6%.

- A classe média ficou sem elementos de proteção - afirmou Pochmann.

Valor per capita de gasto com dívida pública caiu

Curiosamente, o estudo mostra que o pagamento de encargos da dívida pública não é o único vilão. O volume de dinheiro gasto com a dívida caiu 16,7% na última década. Na comparação com Fernando Henrique, o montante per capita gasto com a dívida caiu 13%, de R$1.012 para R$880. Pochmann não investigou outros itens do Orçamento, mas dá pistas do destino do dinheiro.

- Podem ter aumentado os gastos com pessoal, subsídios e renúncia fiscal - apontou.

Os números mostram que o ajuste fiscal do governo não recaiu prioritariamente sobre os gastos sociais. Os investimentos federais foram reduzidos em 39,73%, de R$115 em 2001 e 2002 para R$69 entre 2003 e 2005.

Apesar da redução detectada nos últimos anos, o estudo mostra que os gastos sociais do governo são a mola propulsora da criação de empregos no país. O nível geral de emprego passou de 56,3% da população em 1995 para 57,3% em 2004, com 13,3 milhões de novas vagas criadas. Conforme Pochmann, 33,5% do total estão diretamente relacionados aos gastos sociais e 90% das novas vagas são de até dois salários-mínimos.

"É preciso fazer o que fez JK: um grande acordo"

Segundo o professor, o momento atual é o pior desde 1840, o fim do período de sete décadas entre o ciclo do ouro e o início da produção de café.

A saída, de acordo com Pochmann, é a adoção de uma agenda de investimentos que permita a redução da taxa de juros sem que haja fuga de capitais.

- É preciso fazer o que Juscelino Kubitschek fez: um grande acordo. Ele criou facilidades e disse: quem investir agora vai ganhar dinheiro e quem deixar para depois terá outras condições. Enquanto a atividade produtiva for menos lucrativa do que o mercado financeiro, não sairemos desta situação - disse.