Título: TURISTAS DESTEMIDOS AINDA PASSEIAM EM PARIS
Autor: Deborah Berlinck
Fonte: O Globo, 25/03/2006, O Mundo, p. 45

Americanos dizem ter menos medo da violência nas ruas do que de serem discriminados pela nacionalidade

PARIS. Charles Mattouk, 26 anos, francês radicado em Miami, onde é dono de uma empresa do setor imobiliário, teve uma chegada animada a Paris, onde veio passar uns dias na casa de uma prima.

¿ Segunda-feira, acordei às 9h e havia estudantes queimando latas de lixo na rua. Incendiaram a escola da minha prima ¿ contou.

A aventura de Mattouk continuou fora de Paris. Policiais entraram no trem em que ele viajava de Toulouse para Cahors, no sul da França. Achando que ele estava muito tempo no banheiro, começaram a bater na porta e ordenar que saísse.

Suspeita de que Chirac deixou o circo pegar fogo

Esta não é a primeira experiência do empresário com protestos violentos. Em Miami, ele foi obrigado a fechar as portas de sua empresa durante confrontos entre a polícia e manifestantes contra a Alca. Ontem, comparando as duas experiências, disse que ficou impressionado com o fato de a polícia francesa ter deixado acontecer tanta destruição. Muitos franceses tiveram a mesma reação e suspeitam de que o governo de Jacques Chirac deixou o circo pegar fogo para desmoralizar manifestantes e sindicatos.

¿ Parece que a polícia daqui é bem mais relaxada ¿ observou Mattouk.

Já o artista plástico americano Juan Carlos Cabrera, de Miami, amigo de Mattouk, vai guardar as cenas como recordação de sua primeira viagem à França. Medo dos protestos?

¿ Eu, não. Tive muito mais medo do sentimento antiamericano dos franceses do que de estudantes protestando nas ruas ¿ afirmou.

Cabrera disse entender por que os estudantes franceses estão protestando: para evitar que jovens de menos de 26 anos possam ser demitidos sem justificativa ou compensação num período experimental de dois anos. Mas disse que nos EUA é diferente:

¿ Em Miami, trabalhador é demitido no mesmo dia, assim: ¿Saia daqui.¿. Não deixa de ser um incentivo para as pessoas trabalharem bem. É capitalismo puro. Os bons ficam, os ruins são demitidos.

Paris voltou à calma ontem, depois dos violentos protestos de quinta-feira. O estudante de arquitetura espanhol Joser Sole, de 25 anos, passeava tranqüilamente em Saint-Germain-des-Prés.

Violência na capital francesa, só pela televisão

Na noite anterior, no mesmo local, tropas de choque entraram com carros pela contramão perseguindo e derrubando jovens no meio da rua.

¿ Passei por aqui ontem (anteontem). Não na mesma hora. Só vi a confusão depois, na TV ¿ disse o estudante, que conhecia vagamente o motivo dos protestos mas disse que apoiava os estudantes franceses.

Por sua vez, o físico David Jeck, 36 anos, do Arizona, que fazia turismo com a amiga Tracy Thall em Paris, afirmou:

¿ Antes de vir para cá eu estava em Israel. Confesso que tinha mais medo do sentimento antiamericano dos franceses do que de estar em Israel. Mas não tenho medo. Estamos nos divertindo ¿ assegurou.

A tcheca Katerina, de 29 anos, desembarcou pela primeira vez em Paris na noite da confusão. Mas só foi saber o que aconteceu no dia seguinte, pela TV.

¿ Não tenho medo. Ainda não tive qualquer má experiência aqui ¿ disse.