Título: PT E PSDB DIVERGEM SOBRE O PAPEL DO ESTADO
Autor: Henrique Gomes Batista e Regian Alvarez
Fonte: O Globo, 26/03/2006, O País, p. 12

Na campanha, tucanos vão defender ajuste fiscal e reformas; petistas querem fortalecimento de estatais

BRASÍLIA. Em campos opostos, o PT e o PSDB têm um objetivo comum na campanha eleitoral: convencer o eleitorado de que o país finalmente entrará numa rota de crescimento econômico sustentado. Os caminhos para alcançar esse objetivo não incluem alterações substanciais nos fundamentos da política econômica, embora o discurso dos dois partidos enfatize a mudança. A diferença mais marcante nas propostas do PT e do PSDB para um futuro governo é em relação ao tamanho e ao papel do Estado. Enquanto o PT defende a ampliação desse papel, com ênfase para a atuação das estatais e a eficiência de gestão, o PSDB propõe o enxugamento da máquina pública e a transferência de serviços para a iniciativa privada.

Crescimento é objetivo comum

O detalhamento dos programas econômicos, que ainda estão em discussão, poderá fornecer mais pistas de como cada partido pretende conduzir a economia rumo ao objetivo comum, que é o crescimento sustentado. Mas já é possível identificar diferenças claras no papel que cada um reserva ao Estado na busca dessa meta.

O PT considera que o governo Lula teve o papel de reestruturar o Estado, na sua visão desmontado pelo governo tucano que o precedeu. Neste sentido, deve incluir no programa a defesa de uma participação efetiva do setor público em setores estratégicos da economia para viabilizar o desenvolvimento do país, como na condução de uma política industrial. E reservar um papel de destaque para as empresas estatais na condução das políticas públicas.

¿ Tudo o que já foi feito criou uma base extraordinária para um projeto mais avançado de crescimento com distribuição de renda ¿ afirma Marco Aurélio Garcia, assessor especial da Presidência e autor das diretrizes econômicas do programa do PT.

Já o PSDB vê nessa estratégia um entrave ao crescimento econômico e propõe o caminho oposto, que é o enxugamento da máquina pública, com corte nas despesas de custeio e redução de pessoal.

¿ Vamos propor um novo modelo. Partiremos do ajuste fiscal, com redução do custeio, e vamos incentivar os investimentos privados, principalmente com as PPPs ( Parcerias Público-Privadas) ¿ afirma José Carlos de Souza Meirelles, secretário estadual de Ciência e Tecnologia de São Paulo e um dos coordenadores da campanha tucana.

Apesar do discurso de mudança e das críticas da oposição ou mesmo do PT à atual política econômica ¿ que devem prevalecer no debate eleitoral ¿ nenhum dos dois partidos propõe o rompimento com o modelo que sustenta a economia, baseado no seguinte tripé: superávits (economia para pagamento de juros) elevados, meta de inflação e câmbio flutuante.

PSDB propõe ajuste fiscal

No discurso, PT e PSDB criticam os juros altos e o câmbio valorizado e defendem a austeridade fiscal. O candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, defende um aprofundamento do ajuste fiscal como forma de abrir espaço para a queda da taxa de juros e considera que essa queda, por si só, terá efeitos sobre o câmbio, trazendo a taxa para um nível mais equilibrado. Os tucanos admitem interferências na política cambial mais ousadas do que a do governo atual, mas até agora não trabalham com a hipótese de mudança substancial no modelo de câmbio flutuante.

O PT considera que a queda dos juros já está ocorrendo no atual governo e deve se acentuar no próximo, com a diminuição da vulnerabilidade do país no exterior e com uma mudança de perfil da dívida interna. Quanto ao câmbio, crescem no partido as vozes contrárias ao real valorizado, mas não há ainda uma proposta consensual de mudança na política cambial. Deve prevalecer no discurso petista de campanha a avaliação de que os sacrifícios em defesa da estabilidade econômica já foram feitos na primeira gestão do governo Lula e agora estão criadas as bases para o desenvolvimento sustentável.

¿ O governo tem noção clara de que a fase mais dura do ajuste já foi conquistada e agora terá que se dedicar integralmente ao crescimento ¿ afirma o presidente do PT, Ricardo Berzoini.

Já o PSDB considera que o governo Lula representou um retrocesso na busca desse objetivo, com o inchamento da máquina pública e o adiamento das reformas estruturais. Nesse sentido, as reformas tributária, trabalhista e da Previdência ganham peso na proposta tucana de ajuste fiscal. A intenção do candidato Geraldo Alckmin, se vencer a eleição presidencial de outubro, é costurar uma ampla aliança no Congresso para aprovar já no primeiro ano de mandato algumas dessas reformas.

¿ Um novo ciclo de reformas institucionais é fundamental. A reforma tributária é urgente. A situação tributária do país não pode continuar como está ¿ afirma José Roberto Afonso, assessor econômico da bancada do PSDB no Congresso.

O PT, até mesmo por antever dificuldades políticas na aprovação de projetos no Congresso e pelo forte caráter negativo que essa agenda tem junto ao eleitorado tradicional do partido, tende a não priorizar grandes reformas. Muitos petistas defendem que é possível alcançar maior eficiência do Estado com mudanças administrativas. Por essa visão, o déficit da Previdência, por exemplo, poderia ser minorado com o aperfeiçoamento tecnológico, maior controle de fraudes e com o aumento da massa salarial e do número de empregos formais.