Título: Custo da assinatura é um dos motivos para 10,5 milhões de linhas ociosas
Autor: Luciana Rodrigues e Mirelle de França
Fonte: O Globo, 26/03/2006, Economia, p. 34

Falta demanda em localidades de baixa renda e celular pré-pago vira opção

O alto custo da assinatura básica é um dos motivos que explicam o elevado número de linhas ociosas no Brasil. Desde 2001, o país mantém cerca de 10,5 milhões de linhas instaladas sem uso. E as estatísticas sobre teledensidade ¿ número de telefones por habitantes ¿ mostram, no mapa do Brasil, um retrato do efeito da renda sobre o acesso à telefonia. Se as metas de universalização levaram o telefone a quase todas as localidades do Brasil, nem sempre há demanda para usá-lo.

Segundo o gerente-geral de Qualidade da Superintendência de Serviços Públicos da Anatel, Gilberto Alves, a chamada reserva técnica (linhas instaladas à espera de usuário) cresceu após a privatização, pois às vezes não há demanda por telefone fixo nas localidades que devem ser atendidas pelas metas de universalização.

O gerente destacou, porém, que parte importante da ociosidade atual é resultado de problemas específicos de algumas empresas espelho (companhias que ganharam autorização para concorrer com as concessionárias), cujo negócio não deslanchou.

¿ Onde tem demanda, no entanto, o plano foi bem-sucedido e o nível de ocupação é perto do esperado.

Renato Guerreiro, ex-presidente da Anatel e hoje sócio da consultoria Guerreiro Teleconsult, explica que, na prática, a ociosidade do setor é de 5 milhões de linhas. A diferença, ele esclarece, são os acessos instalados para atender, de imediato, a uma possível demanda dos consumidores. Pelas regras da Anatel, uma nova linha ou transferência deve ser providenciada em até 14 dias úteis.

¿ Esses 5 milhões de linhas impostas pela universalização foram o preço que as empresas pagaram ¿ afirmou Guerreiro.

Governo propõe Telefone Social para facilitar acesso

Para Marcelo Neri, chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas, as metas de universalização foram, em certo sentido, ingênuas:

¿ Em algumas regiões, como na área rural, a população tem menos renda disponível e, também, outras prioridades.

Em Japeri, município que tem uma das menores teledensidades do Estado do Rio ¿ 12,96 linhas por cada cem habitantes, segundo o ¿Atlas Brasileiro de Telecomunicações 2006¿ ¿ a renda é o principal entrave. José Carlos Alonso, presidente da Associação de Moradores do Bairro de São Jorge, em Engenheiro Pedreira, Japeri, explica que o município ainda é prejudicado pela forma de cobrança das tarifas interurbanas. Apesar de ter o mesmo DDD da Região Metropolitana do Rio, as ligações de lá para as vizinhas Nova Iguaçu e Queimados são cobradas como longa distância.

A solução, diz José Carlos, é usar o celular pré-pago. Alternativa cruel para a população de baixa renda, afirma a advogada Flávia Lefèvre:

¿ Em São Paulo, o minuto no telefone fixo pode custar só R$0,037. No celular pré-pago é R$1, ou seja, 27 vezes mais.

Para facilitar o acesso à telefonia fixa, o governo enviou ao Congresso um projeto que cria o Telefone Social, com assinaturas menores para consumidores de baixa renda. A proposta, no entanto, abre brechas para que os usuários de renda mais alta acabem pagando a conta. Para viabilizar o sistema, o governo enviou este mês outro projeto alterando a Lei Geral das Telecomunicações, para permitir os chamados subsídios cruzados, que na prática transfere o custo desse segmento para os demais. O texto atual da lei veda esses subsídios.