Título: RUIM OU PÉSSIMO
Autor: Helena Chagas
Fonte: O Globo, 27/03/2006, O País, p. 4

Lula tem feito aos auxiliares verdadeiras preleções sobre a vida pessoal dos homens públicos. Mas deixando claro que não demitiria Palocci se ficasse comprovado que ele freqüentou a casa de lobby e festas da turma de Ribeirão. Já a quebra do sigilo do caseiro pela CEF o irritou profundamente ¿ e poderia levá-lo a agir de forma diferente se aparecerem provas de que a Fazenda sabia.

Mas é friamente, e não com o coração ou com o fígado, que o presidente está tomando uma das mais difíceis decisões de seu governo. Os prós e os contras da saída de Palocci, e sobretudo seu impacto na campanha da reeleição, estão sendo minuciosamente analisados enquanto as investigações da PF (hoje tem depoimento do presidente da Caixa, Jorge Mattoso) vão agregando as peças finais ao quebra-cabeças:

1. Perda das condições políticas: O próprio Palocci teria dito a Lula, em conversa semana passada, ter perdido as condições políticas para permanecer. Certo é que, ainda que ficando no cargo, perderia boa parte de sua força política, no governo e fora dele. Dificilmente, por exemplo, venceria os embates internos em torno do controle de gastos, como sempre ocorreu. Por outro lado, sua presença funcionaria, ainda que simbolicamente, como uma garantia de que o governo do PT manterá o rumo da política econômica num segundo mandato, tranqüilizando aqueles setores que temem mudanças.

2. O tiroteio da oposição não vai cessar com a queda de Palocci: Já ficou claro para todo mundo que a oposição não descansará enquanto não derrubar Palocci. Mas seu objetivo é atingir o presidente-candidato, o que talvez seja a única forma de levar Lula ao desgaste e dar chance a Alckmin de crescer. Derrubado Palocci, o último anteparo, quem será o próximo? Lula, ao que tudo indica, através do filho, de Okamotto e de outros. É bom lembrar: a CPI dos Bingos funciona até junho.

3. Constrangimentos de Palocci fora do governo podem arranhar Lula na campanha: O Ministério Público de São Paulo, supostamente ligado ao PSDB, já estaria de olho no ministro. Sem ministério e sem mandato, seria alvo fácil de um delegado, um procurador e um juiz de primeira instância que poderia até pedir sua prisão no rastro das denúncias de Ribeirão Preto. As imagens de Palocci preso ou constrangido numa delegacia, ainda que por cinco minutos, fariam a festa dos adversários de Lula na campanha. Essa é uma das principais preocupações do Planalto.

4. Economia não sofre: as aparências podem enganar. O mercado, diversos setores e agentes econômicos deixaram claro na semana passada que uma eventual substituição na Fazenda não provocará abalos na economia. A curto prazo, pode ser que sim. Mais à frente, ninguém sabe.

5. Dificuldades da substituição: Murilo Portugal não tem lá essa familiaridade toda com Lula e o PT. Já os petistas Guido Mantega e Mercadante, que sempre defenderam idéias mais heterodoxas do que as de Palocci, não têm lá essa familiaridade toda com setores que temem mudanças e são importantes na reeleição.

6. Resumo da ópera: não há saída boa à vista para o governo. O desgaste já foi tão grande que o problema de Lula, para sair dessa, resume-se a uma escolha entre o pior e o menos pior.

Semana de dúvidas torturantes

Os últimos momentos do prazo de desincompatibilização sempre reservam surpresas. Alguns fazem suspense, outros ficam indecisos até o final. Basta lembrar que o então prefeito de Juiz de Fora, Itamar Franco, elegeu-se senador em 1974 (começo da trajetória que o levou ao Planalto) graças a um providencial atraso no relógio do cartório eleitoral. Torturado pela dúvida, na verdade ele perdera o prazo.

Será, portanto, uma semana de mistérios e dúvidas. Em São Paulo, Serra pende pela candidatura a governador, ainda que seus amigos tenham dúvidas sobre o acerto da decisão.

E agora os olhos dos candidatos à Presidência se voltam para o Rio, onde tudo está nebuloso. Uma saída de Rosinha deixaria claro que Garotinho jogou a toalha em relação à candidatura pelo PMDB e buscará o Senado ou a Câmara. Mas o problema do casal é que não quer deixar Conde assumir.

César Maia seguiu viagem garantindo que fica na prefeitura. Mas há poucos dias teria admitido candidatar-se ao governo, dando palanque a Alckmin, desde que o vice tucano, Otávio Leite, também não assumisse. Coincidência ou não, o governador de São Paulo, em visita ao Rio, conversou com os dois na sexta-feira.