Título: O FATOR HAMAS
Autor: Renata Malkes
Fonte: O Globo, 27/03/2006, O Mundo, p. 18

Premier palestino do grupo radical tenta convencer eleitor de Israel a votar em moderados amanhã

Faltando um dia para os israelenses irem às urnas eleger o substituto de Ariel Sharon, o primeiro-ministro indicado palestino Ismail Haniyeh rompeu pela primeira vez o silêncio e declarou estar disposto a pôr fim a décadas de conflito no Oriente Médio. Em entrevista coletiva na Cidade de Gaza, o líder do grupo radical islâmico Hamas pediu aos eleitores israelenses que optem por uma administração que favoreça a retomada do diálogo e criticou a recusa do premier em exercício e provável vitorioso das eleições em Israel, Ehud Olmert, em dialogar com o governo do Hamas.

¿ Não queremos mais um banho de sangue na região, apenas direitos e dignidade para o povo palestino. A chegada do Hamas ao poder representa a resolução do problema e o problema hoje está nas mãos de Olmert e seu partido Kadima, não na Autoridade Nacional Palestina (ANP). Ele é quem disse que não vai dialogar com o governo palestino ¿ afirmou Haniyeh.

Analistas israelenses classificaram as declarações de Haniyeh como um pedido velado de socorro. O novo Gabinete do Hamas deve tomar posse isolado de todas as outras facções palestinas na próxima quinta-feira após uma séria crise com o presidente da ANP, Mahmoud Abbas, do partido Fatah, e fracassadas tentativas de montar um governo de coalizão nacional. A instabilidade provocada pela efetivação de um governo islâmico nos territórios criou expectativa nas ruas da Faixa de Gaza e da Cisjordânia. Segundo pesquisa divulgada ontem pelo Centro Palestino de Opinião Pública, pelo menos 50% dos palestinos são a favor da dissolução da ANP devido à falta de cooperação entre o Hamas e o Fatah, as duas maiores forças políticas do governo.

Olmert promete agrupar colônias

Em Jerusalém, o Gabinete israelense preferiu não comentar as declarações. Em meio aos últimos preparativos para as eleições gerais que acontecerão amanhã, o premier em exercício Ehud Olmert, anunciou que não vai realizar novas retiradas unilaterais na Cisjordânia sem consultas estratégicas com os EUA. Em entrevista à rádio Kol Israel, Olmert conclamou os eleitores a comparecer às urnas e afirmou que o voto para o partido Kadima, fundado por Sharon e hoje comandado por ele, é um sinal verde para o chamado ¿plano de agrupamento¿, que vai desocupar assentamentos ilegais na Cisjordânia e anexar os três enclaves de Maaleh Adumim, Gush Etzion e Ariel ao território israelense. Principal plataforma de campanha do recém-criado partido, o plano de agrupamento, baseado nos mesmos moldes do plano de retirada da Faixa de Gaza, em agosto passado, deve permitir a Israel estabelecer suas fronteiras definitivas até 2010.

Após uma campanha atípica, marcada pela tranqüilidade, somente ontem os marqueteiros parecem ter saído às ruas para tentar mobilizar o indiferente eleitor. Em Tel Aviv, grupos de adolescentes eram vistos distribuindo panfletos nas mais movimentadas esquinas da cidade e cartazes começaram a aparecer nos muros do centro. Estimativas apontam que o índice de comparecimento às urnas deve ficar em torno de 65%, o mais baixo da História do país. A previsão de chuva é ainda outro motivo de preocupação, porque poderia ser mais um motivo para deixar o eleitor em casa.

¿ Decidimos sair na última hora para fazer um trabalho que nos leve à vitória. Não podemos deixar passar a oportunidade de eleger um governo melhor para Israel, capaz de combater a pobreza e lidar com os terroristas do Hamas ¿ disse a estudante Gal Cohen, distribuindo fitinhas do partido de direita União Nacional na Praça Dizengoff, no centro de Tel Aviv.

Israel tem 76 ameaças de ataques

As forças de segurança foram colocadas em estado de alerta máximo até o resultado oficial das eleições, previsto para quarta-feira. De acordo com fontes do serviço interno de inteligência, há pelo menos 76 ameaças de atentados e outros 16 planos de supostos ataques terroristas já estariam sendo investigados. Mais de cinco milhões de israelenses são esperados nas urnas e, segundo pesquisas de opinião, o Kadima deve conquistar 36 das 120 cadeiras do Knesset, o Parlamento. O segundo lugar deve ficar com o Partido Trabalhista, comandado pelo sindicalista Amir Peretz, com 18 cadeiras, e o conservador Likud, do ex-primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, chegaria em terceiro com apenas 14.