Título: COITADO DO ELEITOR FLUMINENSE!
Autor: ANDRÉA GOUVÊA VIEIRA
Fonte: O Globo, 28/03/2006, Opiniao, p. 7

Aproxima-se abril e fica mais claro que o estado do Rio corre o risco de entrar na disputa eleitoral apenas como moeda de troca de palanque dos candidatos à Presidência da República. Tanto o PSDB quanto o PT sinalizam namoros com os atuais governantes da capital fluminense, o prefeito Cesar Maia (PFL), e do Estado, a governadora Rosinha, (PMDB), em busca de palanque para a campanha ao Palácio do Planalto.

Curiosamente, são dois políticos que pertenceram a outros quatro partidos antes de estacionarem nos atuais. Ambos têm projetos individuais, desprezam compromissos programáticos. O poder, pelo poder.

Agora surge uma novidade no tabuleiro eleitoral. O candidato da Igreja Universal, o senador Marcelo Crivella, pode também ser trampolim para a conquista de votos para o PT nacional, mesmo tendo o partido seu próprio candidato ao governo do Estado!

Que futuro haverá com um governante que necessariamente aprofundará o perigoso elo já estabelecido entre o interesse público e o confessional?

Coitado do eleitor fluminense! Qualquer enredo lhe é servido, mesmo que não faça sentido algum para quem já não vê saída há um bom tempo. As estruturas partidárias locais sequer procuram ouvir o que as ruas estão dizendo; o fosso se reproduz quando negociam as alianças com os partidos com mais organicidade, como são o PSDB e o PT. Nas terras fluminenses, estes partidos se enfraquecem e acabam sócios minoritários dos fracassos dos outros. Como em 2002 , quando José Serra ficou em quarto lugar no palanque montado para ele pelo prefeito Cesar Maia. Ou quando a aliança Garotinho/PT, embora vitoriosa nas urnas, mais prejudicou do que contribuiu para forjar a imagem do PT fluminense.

Desde a primeira eleição direta para governador em 1982 o estado e sua capital têm sido governados pelas ¿crias¿ do governador Leonel Brizola. Dispensam-se, neste momento, julgamentos políticos, que remetem ao passado. A verdade se impõe com os indicadores socioeconômicos atuais. Ano após ano, não deixam dúvidas de que a fórmula do ¿socialismo moreno¿ não foi, e não é, a mais indicada. À exceção de quatro anos do governo Moreira Franco, que não veio de lá, mas que acabou por lá, todos vieram do mesmo ninho. Mudaram-se as legendas, romperam-se amarras, uns mais que os outros, outros melhores que uns, mas a marca original da redemocratização do Estado fluminense não perdeu a sua cor.

A seqüência dos prefeitos do Rio confirma a sina: só de Cesar Maia, lato sensu, serão 16 anos ao final deste mandato.

Por que então o jogo não muda?

Apesar de adversários ferrenhos quando se trata de disputar espaços políticos no Estado ¿ mesmo às custas de infernizar a vida dos cidadãos ¿ Garotinho e Cesar, donos das duas máquinas partidárias ¶regionais trabalham sempre unidos para impedir o surgimento do elemento novo na política fluminense.

É o que acontece neste momento, quando desponta o nome da deputada Denise Frossard como alternativa real ao governo. Preocupa as estruturas arcaicas da política fluminense, que já se movimentam, com a possibilidade até de se aliarem, para inviabilizar a chegada de ares novos à máquina pública. Seria cômico, não fosse trágico para nós, do Rio, assistir ao PMDB de Garotinho aliado ao PFL de Cesar Maia. E espanta ouvir, aqui e ali, restrições ao nome da deputada, acima de tudo porque, diante da realidade desastrosa, em todos os sentidos, temos pela primeira vez em décadas alguém com densidade eleitoral para pôr fim ao predomínio da mesma coisa.

PSDB e PT, cujos candidatos com chances de chegar à presidência têm origem em São Paulo, precisam perceber que suas alianças não precisam passar necessariamente pelas velhas estruturas esgarçadas e esgotadas do estado do Rio. É possível apostar na oxigenação política, fora do eixo Garotinho-Cesar Maia.

Para os eleitores fluminenses, o jogo de alianças atuais não faz sentido algum. Porque em jogo, aqui, está a própria sobrevivência, a sobrevivência física, o direito à vida, que perdemos. Trata-se, neste Estado, ao contrário dos demais entes federativos, de resgatar as funções básicas deste primeiro setor. Segurança, ao lado da Justiça, pois são funções indivisíveis, só o Estado pode fornecer.

Já perdemos o controle da primeira há tempos e, por conseqüência, o sistema judiciário padece. Com o Estado e o mercado cedendo espaço para a criminalidade, e o crime não se restringe ao tráfico de drogas, só um setor cresce ¿ o dos excluídos.

Não dá para brincar com esta eleição. A fórmula do fracasso já é mais do que conhecida; está aí, nos atuais governos estadual e municipal. Não é o governo federal que vai nos salvar, embora possa nos apoiar a sair desta. A opção existe, aqui, conosco, se não for pulverizada no jogo de acordos nacionais por palanques nada sólidos.

ANDRÉA GOUVÊA VIEIRA é vereadora no Rio (PSDB).