Título: Em mais um dia tenso, dólar chega a subir 3%
Autor: Aguinaldo Novo/Helena Celestino/Patricia Eloy
Fonte: O Globo, 29/03/2006, Economia, p. 29

Apreensão com mudanças na equipe econômica pressiona cotação e moeda fecha a R$ 2,209. Bolsa cai 2,55%

RIO, SÃO PAULO e NOVA YORK. A saída de Antonio Palocci da Fazenda e de outros nomes importantes da equipe econômica levaram os investidores brasileiros ao segundo dia consecutivo de forte tensão e muitas oscilações nos principais mercados. O dólar já iniciou os negócios em alta de quase 3% e o risco-Brasil chegou a subir quase 5% pela manhã. A alta de 3% nas cotações do petróleo leve americano (para US$66,07 o barril) pesou sobre as operações. Ao longo do dia, os mercados reduziram as perdas, mas o tom negativo voltou a pesar no fim da tarde, após nova alta de juros pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano) e indicações de que as taxas continuarão a subir.

O risco-Brasil, indicador da confiança do investidor estrangeiro no país, avançou 2,99%, para 241 pontos centesimais, e a Bolsa de Valores de São Paulo caiu 2,55%. No mercado de câmbio, que estava próximo ao fechamento na hora da divulgação do comunicado do Fed, o dólar encerrou os negócios cotado a R$2,209, em alta de 1,75%, próximo, no entanto, à mínima do dia, de R$2,208.

JP Morgan recomenda venda de ativos brasileiros

Os EUA elevaram os juros ontem pela 15ª reunião consecutiva. As taxas subiram de 4,5% para 4,75% ao ano, mas foi o comunicado do Fed que trouxe pessimismo ao mercado. O comitê avaliou que pode ser necessário mais rigor na política monetária, ou seja, novas elevações nas taxas de juros, o que tende a reduzir o fluxo de recursos para países emergentes.

No Brasil, investidores torceram o nariz para a nomeação de Guido Mantega - um antigo crítico da política econômica vigente - para a Fazenda e ficaram apreensivos com a saída de outros membros do ministério. As preocupações com eventuais mudanças na economia levaram o banco de investimentos americano JP Morgan a reduzir a recomendação para ativos brasileiros.

A instituição avalia que "as mudanças na Fazenda trazem volatilidade desnecessária ao mercado e os novos membros do governo levarão tempo para conquistar a confiança dos investidores". O banco reduziu a posição do Brasil em carteira de "acima da média do mercado" para "neutra" e elevou, de "neutra" para "acima da média" a dos ativos russos.

Para muitos analistas, porém, apesar de seu discurso mais "desenvolvimentista", Mantega não deverá fazer mudanças drásticas na política econômica. A avaliação leva em conta a proximidade das eleições, já que a atual linha tem gerado dividendos para o governo. Além disso, a manutenção de Henrique Meirelles e equipe foi vista como sinal de que o Banco Central manterá independência na fixação dos juros.

- O governo só mexeria na economia se fosse forçado por um quadro externo mais negativo, com fuga de investidores e alta acelerada do preço de ativos. E isso não parece que vai acontecer - diz Luis Fernando Lopes, diretor do banco Pátria.

A segunda avaliação é que a volatilidade no dólar e na Bolsa tende a se manter enquanto Mantega não definir a equipe.

- Seria desejável ter alguém com perfil mais técnico, e menos ligado a partidos - afirma o economista-chefe do Banco Schahim, Silvio Campos Neto.

Os investidores americanos também não receberam bem as primeiras declarações de Mantega e ficaram desconfiados com a saída dos técnicos do ministério. As ações dos bancos brasileiros em Wall Street caíram: o papel do Bradesco perdeu 2,20% e do Itaú, 1,40% .

- Não é sinal de crise, é desconfiança. É difícil dizer que tudo isso é reação às mudanças no Brasil porque nos Estados Unidos o dia também foi movimentado - diz Cassio Calil, diretor-gerente do JP Morgan.

A agência de classificação de risco Fitch distribuiu um comunicado pedindo a manutenção do superávit primário e da austeridade fiscal, um compromisso da equipe de Palocci.

(*) Correspondente