Título: 'Ele lá tem que botar a cabeça no lugar'
Autor: Adauri Antunes Barbosa
Fonte: O Globo, 31/03/2006, O País, p. 9

Caseiro vira herói em ato anti-Lula

SÃO PAULO. Um ato de desagravo ao caseiro Francenildo dos Santos Costa - que acabou provocando a demissão de Antonio Palocci do Ministério da Fazenda - transformou-se ontem, na sede da OAB, em grande manifestação de oposição ao governo. Alguns chegaram a defender o impeachment do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Promovido pelo movimento "Da indignação à ação", coordenado pelo jurista Miguel Reale Júnior, ministro da Justiça no governo Fernando Henrique, o ato teve a participação de juristas e parlamentares.

O deputado Rafael Guerra (PSDB-MG) disse que, além de a quebra do sigilo ser fato gravíssimo, há indícios de que foi tramada no Palácio do Planalto, onde o então ministro Palocci despachou por 15 dias. Por isso, segundo ele, não há como o governo e o presidente alegarem desconhecimento do fato.

- O caso Watergate derrubou o presidente dos EUA, mas isso aqui é muito mais grave. Aqui houve invasão de privacidade, quebra de sigilo e divulgação do sigilo. É um desrespeito total às leis e à Constituição - disse Guerra, referindo-se ao episódio que derrubou Richard Nixon da presidência dos Estados Unidos, em agosto de 1974.

De acordo com Miguel Reale Jr., o passo em direção a um pedido de impedimento é a formação de uma comissão de juristas e parlamentares para acompanhar as investigações.

- Vamos esperar que essa comissão levante todos os dados para que haja a promoção efetiva desse pedido. Não vamos fazer açodadamente, mas quando houver elementos de provas. Sem dúvida, se o presidente da República participou da quebra do sigilo, isso é crime de responsabilidade - disse.

O deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), que pagou uma das duas passagens de Francenildo e de seu advogado, Wlício Nascimento (a segunda foi paga por advogados e juristas), disse considerar a hipótese do impeachment e também citou Watergate:

- Se alguma coisa foi tramada no Planalto, é muito mais grave que Watergate. É um crime que precisa ter uma resposta legal e política.

Aparentando tranqüilidade no clima de assembléia estudantil, Francenildo foi festejado como herói.

- Hoje agradeço à minha mãe e reconheço as pisas que ela me deu. Por isso toquei o barco e chutei o balde. Agora ele lá (Lula) tem que botar a cabeça no lugar. Apesar de ele ter idade pra ser meu pai, só está do lado dele. O único erro é que ele só está do lado dele. Eu queria dizer que eles estão sujando a bandeira do trabalhador. Isso é o que eu sinto hoje. É só isso que eu queria falar. Eu não tenho essa vocação - disse Francenildo.