Título: NA ESTAÇÃO, UM AMBIENTE BEM DIFERENTE DOS FILMES
Autor: Cristina Azevedo
Fonte: O Globo, 31/03/2006, O Mundo, p. 29

Tripulantes usam comida desidratada, dormem em sacos e tentam adaptar sua rotina ao ambiente de microgravidade

Conforto no espaço ainda é ficção científica. Corredores amplos, alojamentos individuais semelhantes a quartos, gravidade igual à da Terra e sintetizadores de alimentos ainda são exclusivos de filmes como "Jornada nas Estrelas", que se passa no século XXIII. A realidade do astronauta Marcos Pontes, neste início do século XXI, na Soyuz e depois na Estação Espacial Internacional, é bem diferente.

O ambiente de microgravidade é o primeiro obstáculo. A doença da locomoção espacial afeta 70% dos astronautas nos três primeiros dias de vôo.

- Numa viagem curta as alterações são mais nos sistemas neurovestibular e cardiovascular - explica Thais Russomano, Coordenadora do Laboratório de Microgravidade da PUC do Rio Grande do Sul e PhD em Medicina Espacial. - A pessoa fica ligeiramente perdida, não sabe o que é em cima, embaixo. Isso gera um conflito no cérebro e ela adoece. Fica nauseada. Há uma redistribuição dos fluidos e do sangue da parte inferior para a parte superior do corpo, mas depois ela se adapta.

Cardápio se repete a cada oito dias

A alimentação está longe de ser como na ficção, mas já é bem melhor do que a enfrentada pelos primeiros astronautas, que chegaram a usar alimentos em tubos de alumínio.

Os alimentos podem ser reidratáveis, irradiados (uso de radiação para matar bactérias), termoestabilizados (o calor é usado destruir microorganismos nocivos) e sob forma natural, como nozes e biscoitos. A água é adicionada à comida desidratada, que é aquecida em forno. Podem ser sopas, galinha com arroz, em embalagens especiais, feitas de material flexível para depois passarem pelo compressor de lixo. O velcro no fundo da embalagem faz com que ela não flutue pela nave. Já as termoestabilizadas, que incluem frutas e peixe, são levadas em latas e copos plásticos, semelhantes aos vistos em supermercados. Há também bebidas em pó, como café e suco de laranja.

Na nave são usadas bandejas presas ao colo por tiras ou à parede. Mas na estação há uma pequena mesa para três pessoas. A tripulação tem um ciclo de cardápio de oito dias, com os pratos se repetindo. O menu é metade americano, metade russo. A água é reciclada e até a umidade do ar é reaproveitada.

Pela janela, um dia de apenas 90 minutos

Dormir pode não ser tão fácil. Como o dia na estação dura só 90 minutos, muitos astronautas usam máscara para não serem incomodados pela claridade. A tripulação costuma utilizar sacos de dormir, fixados às paredes ou ao assento. Na estação, há ainda duas pequenas cabines individuais.

A higiene também teve que ser adaptada à microgravidade e à limitação de água. Ela inclui xampu sem enxágue e banho de esponja. No banheiro, o vaso sanitário inclui barras para posicionar as pernas, e a descarga é a vácuo. Cada astronauta tem o próprio aparato urinário.

Astronautas também têm períodos de descanso. Eles se exercitam, lêem, vêem filmes, conversam com a família - atividades para tentar diminuir a sensação de isolamento e o estresse que isso pode causar.

Um assunto pouco comentado é o sexo no espaço - ou a falta dele. Contam que durante uma simulação da vida na estação, feita na Terra em 2000, um astronauta russo tentou beijar uma pesquisadora canadense.

- Nenhum estudo informa se já aconteceu alguma atividade sexual no espaço. Mas se a Nasa e outras agências quiserem gerar colônias em outros planetas vão ser obrigadas a lidar com isso - diz Thais Russomano.

Inclui quadro:A ESTAÇÃO ESPACIAL INTERNACIONAL - ISS