Título: NOTA CAUSA INDIGNAÇÃO EM VÍTIMAS DE TORTURA
Autor: Jailton de Carvalho
Fonte: O Globo, 01/04/2006, O País, p. 4

Historiadora afirma que tom da ordem do dia do Exército é anacrônico e fala de ressentimentos

A nota do Exército defendendo o golpe militar de 1964 causou indignação na vice-presidente do grupo Tortura Nunca Mais Cecília Coimbra. Ela lembrou que há hoje, no governo, ministros que foram torturados pelo regime militar, entre eles a chefe da Casa Civil, Dilma Roussef. Cecília Coimbra criticou ainda o trecho da nota que diz que o governo militar favoreceu a implantação da democracia:

¿ É lamentável e rizível. Estão falando da democracia dos porões do DOI-Codi, dos desaparecidos políticos? Que tipo de democracia é essa? Da tortura, do desaparecimento, do seqüestro?

O deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ), exilado durante o período militar, afirmou que a interpretação do Exército sobre o golpe não pode prevalecer sobre a do governo:

¿ Para o governo, foi um movimento golpista, tanto que estão no governo várias pessoas que sofreram a repressão do movimento militar.

A historiadora Maria Celina D'Araújo, do CPDoc da Fundação Getulio Vargas, disse que a nota do Exército tem um tom extemporâneo:

¿ Ela está falando de questões políticas gerais do país no momento em que as Forças Armadas têm se pautado pelo silêncio. Essa nota cheira a passado. É uma nota anacrônica, que fala de ressentimentos. Não se coaduna com a imagem do Exército hoje.

Os historiadores e o Tortura Nunca Mais discordam de um trecho da nota que afirma que o golpe teve o apoio popular. Cecília Coimbra diz que a afirmação é uma desfaçatez. Já Maria Celina e Francisco Carlos Teixeira, professor de história contemporânea da UFRJ, afirmam que as passeatas e a mobilização pró-João Goulart mostram o contrário.

¿ Havia apoio popular, mas isso não quer dizer que todos apoiaram. Facções importantes do PTB, do próprio PSD e, claro, a esquerda engajada, estavam do outro lado, e pagaram alto preço por isso ¿ afirmou Francisco Carlos.