Título: Nas Forças Armadas, escolha de Pires é vista com naturalidade e indiferença
Autor: Jailton de Carvalho
Fonte: O Globo, 01/04/2006, O País, p. 4

`Não terá repercussão positiva nem negativa. Não desperta tensão¿, diz general

BRASÍLIA. A decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de transferir o ministro da Controladoria Geral da União, Waldir Pires, um dos políticos cassados pelo regime militar, para o comando do Ministério da Defesa foi recebida com naturalidade e, em alguns casos, até com certa indiferença pela cúpula das Forças Armadas. Segundo influentes oficiais ouvidos pelo GLOBO, o passado esquerdista de Pires não representa ameaça à relação do novo chefe das três forças com as tropas.

Para eles, a realidade do Brasil hoje é diferente do cenário que pôs a esquerda e os militares em campos opostos em 1964. Numa demonstração de que a recepção a Pires é amistosa, o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Luiz Carlos Bueno, telefonou imediatamente para o ministro quando soube da escolha.

¿ O comandante ligou para demonstrar a satisfação da Aeronáutica com a vinda dele para a Defesa ¿ disse um oficial do Centro de Comunicação Social da Aeronáutica.

Até então, a Aeronáutica era vista como um dos possíveis focos de resistência à nomeação do baiano Waldir Pires. O comandante Luiz Carlos Bueno, um militar com perfil de negociador e com bom trânsito na política, esteve cotado internamente para assumir a vaga deixada pelo vice-presidente José Alencar. Cotação que subiu depois que o general Francisco Albuquerque, comandante do Exército, ficou na berlinda por causa da carteirada no vôo da TAM para Brasília.

Passado de Pires não vai pesar

Mas, para desfazer qualquer rumor de descontentamento, Bueno tratou de ligar para Pires e dar as boas vindas ao novo ministro. Oficiais da Aeronáutica dizem que Pires se aproximou da força no período em que esteve à frente da CGU.

¿ Na minha avaliação, a nomeação dele (Waldir Pires) não terá repercussão positiva e nem negativa. Ele não desperta tensão. Vai ser recebido com indiferença ¿ disse um general ligado ao comandante do Exército, Francisco Albuquerque.

Para essa fonte militar, a militância de Waldir Pires na esquerda num período crucial da história do país é importante, mas não terá reflexo na administração das Forças Armadas. Ele argumenta que presidentes de outros países da América Latina nomearam ministros da Defesa de origem esquerdista e nem por isso entraram em choque com os comandantes militares.

Pelas análises internas, a visão pragmática dos políticos sobre os aspectos operacionais das três forças é mais importante que as orientações ideológicas de cada um.

¿ Vamos olhar para a frente, sem renegar o passado, que é história e não pode ser negado ¿ disse um general.

Para outros militares, da ativa e da reserva, Waldir Pires será recebido com indiferença porque não tem peso político e não tem planos de fazer mudanças de impacto na dinâmica das Forças Armadas. Para esses analistas, Pires deverá seguir os passos de José de Alencar, seu antecessor, e atuar apenas como um interlocutor entre as três forças e o presidente da República.

¿ Ele vai ser uma rainha da Inglaterra. Vai deixar grandes projetos parados e, certamente, dará liberdade de ação às Forças Armadas, como aconteceu com José Alencar ¿ afirmou um oficial da reserva.