Título: GOVERNO DO PT FRUSTRA ESQUERDA ALEMÃ
Autor: Gerson Camarotti
Fonte: O Globo, 02/04/2006, O País, p. 8

Para admiradores de Lula, presidente não cumpriu as suas promessas

BERLIM. Poucos políticos brasileiros despertaram tanta simpatia na esquerda alemã quanto o presidente Lula. Durante as campanhas presidenciais que disputou, era sempre convidado para visitar a Alemanha, onde encantava a chamada ¿linke szene¿ (cena esquerdista). Para muitos intelectuais da esquerda, os últimos escândalos que culminaram com a demissão do ex-ministro Antonio Palocci fizeram a boa imagem de Lula desmoronar. Para Gunther Maihold, do Instituto de Relações Internacionais, o caso Palocci pode ser o início do ¿crepúsculo do governo do PT¿.

¿ Com o desfecho do caso Palocci, a equipe de Lula começa o ano eleitoral praticamente paralisada, pois o PT esteve envolvido no que ninguém esperava que fosse possível, a corrupção ¿ diz o cientista político, ressalvando que na crise atual o Brasil teve a sorte de sofrer menos efeitos dramáticos para a economia porque ¿os dados econômicos, no momento, são sólidos¿.

O professor Peter Birle, diretor do grupo de pesquisa do Instituto Ibero América da Universidade Livre de Berlim, viu Lula pela primeira vez no fim dos anos 80, quando o então líder petista fez uma conferência sobre sociedade civil. Admiradores de toda a Alemanha foram a Berlim assistir à conferência promovida pela Fundação Friedrich Ebert.

¿ Eu me lembro que Lula impressionou muito a platéia com o seu caráter quase messiânico de lutador contra a injustiça social ¿ conta Birle, que há 20 anos faz pesquisas sobre o Brasil.

PT era comparável ao Partido Verde alemão

Peter Birle conta que o PT conquistou os intelectuais como um partido que nada tinha a ver com o establishment típico da América Latina e que tinha um líder que era quase um guru. Era ¿um movimento das bases¿, comparável ao partido verde da Alemanha.

A primeira reação dos admiradores alemães de Lula diante da crise política brasileira e dos escândalos de corrupção foi afirmar que talvez tudo fosse uma artimanha da oposição. Mas agora a reação é de choque.

¿ Muitos viram como uma traição da esquerda brasileira que exatamente esse PT, que sempre se mostrava como um anti-corrupto, também estivesse afundado em irregularidades ¿ diz Birle.

Gunther Meinhold afirma que o PT perdeu inteiramente a sua credibilidade, embora não seja o primeiro partido brasileiro a se envolver em corrupção. Mas como um partido que era visto na Europa como um movimento social, os escândalos ruíram a base moral do PT.

Governo não reflete o PT dos tempos de oposição

Mas ele diz que, por enquanto, parece que o presidente brasileiro passa por ingênuo por não ter percebido o que acontecia ao seu redor:

¿ Se o candidato da oposição não conseguir pôr Lula no papel de aliado dos envolvidos na corrupção, no centro das atenções, pode ser que o PT adote a estratégia de esperar pelo esquecimento dos escândalos e centralize a sua campanha no carisma do presidente, que é maior do que o de Geraldo Alckmin.

Segundo Meinhold, a chance do PT é que os eleitores reflitam de forma diferente dos analistas e votem (nas eleições presidenciais deste ano) no candidato que considerem mais simpático, e as questões da corrupção e do candidato ¿mais limpo¿ fiquem em um segundo plano.

Além da corrupção, o governo do PT causou decepção entre os admiradores europeus por não ter cumprido as promessas feitas por Lula, nas excursões à Alemanha, de ¿renovação social¿ do Brasil.

¿ Há uma grande decepção porque o balanço da prometida renovação social foi até agora muito menor do que o esperado. No fundo, o governo Lula não tem uma característica da esquerda, do movimento social que era quando o PT era da oposição ¿ acrescenta o cientista político de Berlim.

Para estudioso, oposição não deve priorizar os escândalos

Peter Birle diz que, com a demissão do ministro da Fazenda, as chances de reeleição de Lula foram reduzidas consideravelmente, da mesma forma que aumentaram as chances do PSDB, que tem perfil de competente em termos de economia e de honestidade.

¿ Mas se a oposição centrar a sua campanha nos escândalos do governo, no lugar de ressaltar um perfil próprio, as suas chances serão menores ¿ adverte ele.