Título: Guerra pode deixar CPI sem relatório aprovado
Autor: Bernardo de la Peña
Fonte: O Globo, 02/04/2006, O País, p. 14

Oposição ameaça com indiciamento de Lula e caso Gamecorp; setores do PT tentam aprovar texto paralelo

BRASÍLIA. De olho no embate que se dará na campanha eleitoral a partir de julho, tucanos e petistas se preparam para implodir a negociação em torno do relatório final do deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) na CPI dos Correios. Na sexta-feira, o fracasso do entendimento era dado como certo. Setores do PT querem aprovar um relatório paralelo, enquanto tucanos e pefelistas ameaçam ampliar o rigor do texto de Serraglio. Na guerra de versões, o que está em jogo é quem vai ter a melhor história para contar aos eleitores na campanha.

Os governistas ainda se dividem entre os que tentam negociar e aprovar um texto e os que insistem na apresentação de um relatório paralelo, que pode levar a CPI a ficar sem relatório aprovado. É um discurso que interessa a setores do PT: a CPI tanto fez mas nem relatório conseguiu aprovar.

Já a oposição prepara um contra-ataque no Congresso e terá discurso de campanha em qualquer situação. O PFL e o PSDB, para desgastar o governo cada vez mais, vão dizer que o PT trabalhou para inviabilizar a CPI. E se fracassar a negociação para votação do texto de Serraglio, devem tentar incluir o pedido de indiciamento do presidente Lula no relatório. A tentativa tem pouca chance de êxito, mas atende ao objetivo de desgastar o governo.

Oposição vai fazer do texto bandeira de campanha

O secretário-geral do PSDB e relator adjunto da CPI, Eduardo Paes (RJ), disse que a oposição tem ainda outra arma contra o governo: um requerimento para prorrogar a CPI, que já tem as 171 assinaturas necessárias da Câmara e 27 no Senado, caso saia derrotada da votação do relatório na terça-feira.

O PFL também estuda colher assinaturas para uma nova CPI para concluir os trabalhos da dos Correios, mas instalada desta vez só no Senado, onde a oposição tem mais força. Se o PT insistir na não aprovação do relatório final, pefelistas e tucanos preparam ainda uma comitiva de parlamentares para percorrer o país apresentando o texto de Serraglio nos estados, numa prévia de campanha eleitoral suprapartidária. E também uma marcha do Congresso ao prédio da Procuradoria Geral da República, em Brasília, para levar o relatório, fazendo dele bandeira de campanha.

Retirada do texto de Serraglio por pressão do governo, a referência que havia no relatório final ao negócio feito pela Gamecorp, empresa da qual é sócio o filho de Lula, Fábio Luiz Lula da Silva, comprada pela Telemar, também pode voltar ao debate:

¿ Já estou com a emenda que restabelece o texto da Gamecorp pronta. Mas só vou apresentar se for conveniente. Só vamos chegar ao presidente se todas as pontes forem explodidas. A oposição está aberta ao diálogo até o fim porque não quer o ônus de enterrar a CPI. Esse ônus vai ficar com o PT e com o governo ¿ afirma o deputado Antônio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA).

Paes minimiza a derrota da oposição ¿ que deve acontecer por um ou dois votos se a correlação de forças na CPI permanecer a mesma. Ele argumenta que o efeito prático de encerrar a CPI sem um texto aprovado oficialmente é pequeno. Para ele, politicamente, o texto de Serraglio já foi apresentado e será usado na campanha eleitoral.

Do ponto de vista legal, pondera, não há diferença porque a CPI já havia aprovado um requerimento que permite compartilhar os documentos com o Ministério Público, a Polícia Federal e o Tribunal de Contas da União. Portanto, não seria necessária a aprovação formal do relatório para que os documentos obtidos pela CPI como provas fossem encaminhados.

¿ O PT está achando que vai transformar essa comissão num salão de baile completo, mas nenhum de nós vai aceitar a coreografia conduzida pelos senhores Lula e Dirceu. Então, a dança deles da pizza vai continuar sendo um número solo ¿ afirma o tucano.

O líder do PT na Câmara, Henrique Fontana (RS), defensor ardoroso dos petistas e do governo no episódio, vai insistir, em nome da bancada, em tirar do relatório a existência do mensalão:

¿ Não concordamos que houve mensalão, concordamos que houve caixa dois, o repasse ilegal de recursos para os partidos. Já nos desculpamos por isso, mas até agora não tem nenhuma prova de mensalão.

Da ala mais ponderada do PT, aquela que defende a aprovação de algum relatório final da CPI, o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP), sub-relator de contratos da CPI, alerta para o risco de prejuízo para todos os lados:

¿ A polarização política vai levar a CPI a um desastre: a não aprovação do relatório ¿ resumiu Cardozo.

Votação de uma só vez: texto será aprovado ou rejeitado

O relatório de Serraglio deve ser votado terça-feira, dia 4, na CPI. Pelas regras previstas no Regimento Interno do Senado Federal, o documento será votado de uma só vez. O texto tem de ser aprovado ou rejeitado. Em caso de rejeição, será designado um novo relator entre aqueles parlamentares que apresentaram textos alternativos, chamados de votos em separado, ao de Serraglio.

Em caso de aprovação de um destes textos, ele pode se tornar o relatório da comissão. O problema é que se não tem maioria para aprovar o texto de Serraglio, a oposição espera conseguir impedir também que o PT aprove um texto alternativo, e neste caso espera contar com o apoio de integrantes da CPI que não gostariam de ver todo o trabalho da comissão alterado.