Título: O mago da integração com Chávez e Kirchner
Autor: Mariza Louven
Fonte: O Globo, 02/04/2006, Economia, p. 38

Darc Costa, ex-vice-presidente do BNDES, articula projeto de integração do Brasil com Venezuela e Argentina

O carioca Darc Antonio da Luz Costa gosta de ser comparado ao general Golbery do Couto e Silva, chamado de ¿mago da abertura¿ por ter negociado, nos bastidores da ditadura, a saída dos militares do poder. Autor da tese ¿Estratégia Nacional ¿ A Cooperação Sul-Americana como caminho para a inserção internacional do Brasil¿, escrita em 1999 e transformada em livro, Costa vem sendo apontado como o articulador informal do projeto de integração sul-americana que tornou-se prioridade na agenda dos presidentes de Brasil, Venezuela e Argentina.

¿ Não sou amigo do Kirchner. Do Chávez, sim ¿ admite.

Costa faz sigilo sobre os projetos em que atua, exceto o do gasoduto de US$20 bilhões ligando a Venezuela, o Brasil e a Argentina. Mas confirma ser consultor em negócios do governo e de empresas da Venezuela e da Argentina ¿ país para onde viaja pelo menos uma vez por mês para reuniões, eventualmente, com o presidente Néstor Kirchner.

¿ Se ele é amigo do Chávez e o influenciou para que pedisse o ingresso do país no Mercosul, ótimo. Isso pode acelerar a entrada dos produtos brasileiros na Venezuela. Mas o projeto brasileiro de integração é mais antigo ¿ confidenciou uma fonte do Itamaraty.

Cientista política: integração é uma idéia cíclica

Em 2005, Lula e Kirchner celebram o 20º aniversário da Declaração do Iguaçu, assinada pelos ex-presidentes Raul Alfonsín, da Argentina, e José Sarney, do Brasil, no histórico encontro de 1985 em que os dois países se reaproximaram depois de afastados durante as ditaduras militares. A cientista política da Fundação Getulio Vargas, Maria Celina D¿Araujo, acha exagero atribuir a Costa a paternidade da integração:

¿ Esta é uma idéia cíclica no Brasil. Nos anos 50, o Pacto do ABC (Argentina, Brasil e Chile) foi uma das causas da queda de Getulio Vargas, acusado de articular acordo secreto com o então presidente argentino Juan Domingo Perón ¿ diz ela.

Mas o ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) Carlos Lessa lembra que o projeto voltou a ganhar intensidade e tornou-se prioritário no governo Lula:

¿ Quando eu e Darc estávamos no BNDES, abrimos caminho para projetos que favoreciam a integração.

Lessa acha que Costa tem uma peculiar competência para questões estratégicas. O brigadeiro Sergio Ferolla, ministro aposentado do Superior Tribunal Militar e ex-comandante da Escola Superior de Guerra (ESG), também o vê como um técnico de visão estratégica apurada.

Costa ficou 14 anos no Centro de Estudos Estratégicos da ESG, cedido pelo BNDES ¿ onde havia ingressado por concurso em 1975. Engenheiro formado pela PUC do Rio, saiu do banco em 1989 quando Márcio Fortes tornou-se presidente da instituição. Costa teria discordado da decisão de Fortes de acabar com a assessoria de segurança à informação do banco, formada por funcionários do Serviço Nacional de Informações (SNI).

¿ Era um resquício da ditadura militar, que na época dava os últimos suspiros ¿ conta um funcionário do BNDES afastado por Costa quando este retornou ao banco em 2003, como vice-presidente, pelas mãos de Lessa, seu amigo e vizinho do Cosme Velho.

¿ Não é verdade. Dizem isso porque eu e a presidente da associação de funcionários do banco fomos arrolados numa ação que o pessoal do SNI moveu contra o BNDES, no governo Collor. Marcio Fortes conviveu muito bem com eles ¿ diz Costa.

Costa sabe que fez inimigos.

¿ Minha divergência com o Marcio Fortes é que eu era contra o uso do banco para fazer privatizações ¿ acrescentou ¿ E quando voltei, mexi com muitos interesses. Havia pessoas no mesmo cargo há 15 anos ¿ justifica.

Na época, Costa foi criticado por ter levado dois militares da reserva para o BNDES, encarregados inclusive de fazer varreduras no sistema de comunicações. Costa também teria mandado dezenas de técnicos para a ¿geladeira¿:

¿ Fiquei meses sem nem poder tirar uma xerox ¿ reclama um dos afastados.

Uma funcionária lembra de Costa como galanteador:

¿ Pintoso, fazia sucesso com as mulheres e as tinha em maior número entre seus assessores ¿ recorda.

Costa admite que agradava as moças, no Santo Inácio, tradicional colégio do Rio onde cursou até o ensino médio.

¿ Mas estou fora do mercado há 34 anos ¿ brinca ele, casado, três filhos e dois netos.

Integrante da equipe que formula uma proposta econômica para a eventual candidatura própria do PMDB à Presidência da República, Costa acha que Lula se defrontará, na campanha deste ano, com a questão do desenvolvimento.

¿ O desenvolvimento depende do crescimento e, este, de infra-estrutura ¿ afirma.

Uma defesa da infra-estrutura para o crescimento

Membro do Centro Brasileiro de Estudos Estratégicos e do Conselho da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), Costa acredita que o desenvolvimento do Brasil passa pela criação de um megaestado nacional integrado na América do Sul. O avanço será mais rápido pelo caminho da infra-estrutura do que da moeda, raciocina, até porque há interesse das empresas brasileiras em aumentar sua presença física na região. Só no ano passado, o Brasil teve um superávit comercial de US$5,6 bilhões apenas com Venezuela e Argentina.

¿ A base multinacional brasileira está crescendo nos países vizinhos por meio das exportações, da prestação de serviços, da compra de filiais e de fusões ¿ acrescenta.

Costa defende a liderança do Brasil: ¿Nosso povo seria o único provido das mágicas necessárias a fazer o movimento de construção de uma única pátria humana¿, propõe em seu livro.

Mas em artigo publicado ano passado no jornal ¿Valor¿, o economista Fábio Giambiagi, que trocou o BNDES pelo Ipea durante a gestão Lessa-Costa, analisa o livro e alfineta: ¿A pergunta é se esse projeto nacional, baseado na conquista do sistema solar, na mundialização a partir do Brasil, na crença da superioridade do povo brasileiro, na hipótese de bloqueio naval dos EUA e na explosão demográfica, é o melhor para o país. Eu desconfio que não, mas o leitor tire suas próprias conclusões¿.

¿ O problema do Giambiagi é que ele vivia dando entrevistas, tinha muito status e o perdeu ¿ rebate Costa.