Título: Palocci já pode ser indiciado
Autor: Cristiane Jungblut, Jailton de Carvalho e Demétrio
Fonte: O Globo, 03/04/2006, O País, p. 3

Dois assessores do Ministério da Justiça depõem e incriminam ex-ministro

APolícia Federal já tem elementos para indiciar o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci por violação do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa, que o acusa de ter freqüentado uma mansão destinada a festas e lobby na capital federal. Pesam na avaliação ¿ antes mesmo de ouvir Palocci, nesta quarta-feira ¿ o testemunho do ex-presidente da Caixa Econômica Federal Jorge Mattoso, em que ele afirmou ter entregue pessoalmente o extrato da conta de Nildo a Palocci, e os depoimentos, voluntários, do secretário de Direito Econômico do Ministério da Justiça, Daniel Goldberg, e do chefe de gabinete do ministro Márcio Thomaz Bastos, Cláudio Alencar, tomados ontem em Brasília. Mattoso já foi indiciado pela PF.

Goldberg confirmou que esteve na casa de Palocci na noite do dia 16 de março e que presenciou a chegada de Mattoso à casa. Disse que Palocci lhe perguntou se era possível a PF investigar o caseiro com base em boatos de que ele teria movimentação financeira atípica. Goldberg e Alencar relataram à PF que, depois de averiguar os procedimentos com um delegado federal, informaram a Palocci, no dia seguinte, que não havia nada contra Nildo e que a PF não tinha como investigá-lo.

¿ Diante disso, não há mais o que discutir. Acho que sim, que há elementos para indiciá-lo ¿ afirmou o procurador Gustavo Pessanha, que acompanha o caso e a quem caberá decidir se haverá denúncia contra Palocci à Justiça ao final das investigações.

Ontem, Palocci, por meio de seu advogado José Roberto Leal, negou ter dado a ordem a Mattoso para a quebra do sigilo e afirmou que manterá esta versão no depoimento de quarta-feira. Até integrantes do governo acreditam que é muito delicada a situação do ex-ministro.

Marcelo Netto, ex-assessor de Palocci no ministério, será ouvido pela PF por sua suposta participação na quebra de sigilo e no vazamento do extrato à imprensa. O procurador Pessanha já adiantou que, em princípio, também há elementos para indiciá-lo. Goldberg e Alencar confirmaram que Marcelo Netto estava na casa do Palocci nos dias 16 e 17. Mattoso deverá voltar a ser ouvido esta semana.

O escândalo da quebra do sigilo do caseiro começou no dia 16, quando Palocci se reuniu com Mattoso. Depois, o então presidente da CEF pediu aos funcionários do banco que emitissem o extrato, recebeu o documento de volta e foi até a casa de Palocci para lhe entregar os dados bancários do caseiro. Palocci também telefonou para Goldberg pedindo que ele fosse à sua residência à noite. Goldberg foi até lá acompanhado no carro por Cláudio Alencar, que não ficou na casa. Palocci falou dos rumores de que Nildo recebera dinheiro em sua conta e que tinha conhecimento de que a imprensa divulgaria o caso.

No Planalto, guerra entre Palocci e Thomaz Bastos

Goldberg relatou aos policiais ter dito ao ex-ministro que, até onde ele tinha conhecimento do caso, o caseiro estava sendo protegido pela PF. No dia 14, Francenildo dera entrevista ao ¿Estado de S.Paulo¿ afirmando que Palocci freqüentava a mansão alugada por ex-assessores de Ribeirão Preto (SP) acusados de corrupção.

No dia 17, Goldberg e Alencar se encontraram com o ex-ministro pela manhã e informaram a ele que não poderia haver investigação. À noite, informaram o ministro Márcio Thomaz Bastos do teor da conversa.

Para fontes próximas da investigação, Palocci assediou Goldberg para participar da operação contra Nildo. No dia 17, a revista ¿Época¿ divulgou em seu site o extrato do caseiro, apontando que ele recebera R$25 mil, depositados por um suposto pai biológico. No domingo, dia 19, o ministro Márcio Thomaz Bastos determinou ao diretor-geral da Polícia Federal, Paulo Lacerda, que fosse aberto um inquérito sobre a quebra ilegal de sigilo.

A partir de então, abriu-se uma guerra dentro do Palácio do Planalto. De um lado, Palocci, afirmando ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva até a sua demissão, dia 27, que não tinha participado da quebra de sigilo. De outro, Márcio Thomaz Bastos informando ao presidente que as investigações levavam à CEF e ao ministro.

Ontem, o Ministério da Justiça reiterou que no primeiro dia útil após a divulgação das informações bancárias do caseiro foi aberto inquérito pela PF. Segundo o Ministério da Justiça, as investigações já esclareceram a participação de funcionários da CEF no episódio. Mas o caseiro também passou a ser investigado. No dia 23 de março, a PF pediu à Justiça Federal a quebra do sigilo telefônico e bancário dele, para apurar a origem dos R$25 mil depositados em sua conta.

Ontem Thomaz Bastos e assessores do presidente passaram o dia sendo informados do assunto.