Título: Governo pressionará Evo Morales a uma solução sobre mercado de gás
Autor: Eliane Oliveira e Flávia Oliveira
Fonte: O Globo, 03/04/2006, Economia, p. 14

Objetivo de reunião hoje é que presidente boliviano retome negociações

BELO HORIZONTE. Irritado com as recentes manifestações de autoridades bolivianas sobre a reestatização do mercado de gás, com ataques diretos à Petrobras, o governo brasileiro quer que o presidente da Bolívia, Evo Morales, baixe o tom e volte a negociar com o Brasil uma solução que agrade aos dois lados. Esse recado será transmitido a Morales em uma reunião hoje pela manhã, em Belo Horizonte, após a abertura da assembléia de governadores dos 47 países associados ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

O encontro não terá a participação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que permanecerá em Brasília. Morales vai conversar com o assessor internacional da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia; o secretário-geral do Ministério das Relações Exteriores, Samuel Pinheiro Guimarães; e o subsecretário para Assuntos de América do Sul do Itamaraty, José Felício. Eles vão dizer ao presidente boliviano que o governo brasileiro não admite discutir o tema pela imprensa e está aborrecido com o fato de as negociações terem sido interrompidas, de forma unilateral, em fevereiro último, pelas autoridades daquele país.

Morales será lembrado de que a Petrobras é a empresa que mais investe na Bolívia e não pode ser prejudicada com declarações negativas, por ser de capital aberto e ter ações nas principais bolsas de valores do mundo. Desde 1996, a Petrobras investiu US$1,5 bilhão na exploração e transporte de gás e refinarias bolivianas. É a maior empresa e representa quase 20% do Produto Interno Bruto (PIB, o conjunto das riquezas produzidas em um país) da Bolívia, possuindo cerca de 10% das reservas de gás daquele país. Os representantes do governo brasileiro dirão ao presidente boliviano que, se ele quiser conversar com Lula, que o faça por telefone ou vá em sua aeronave a Brasília.

Mais de 50% do gás usado no Brasil vem da Bolívia

O clima entre as autoridades brasileiras que participavam dos debates que antecederam a reunião do BID refletia bem a crise que se formou entre Brasil e Bolívia. Marco Aurélio Garcia foi taxativo:

¿ Se houve exacerbações, não foi de nossa parte.

O presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, fez uma defesa enfática de uma solução negociada para pôr fim ao impasse com a Bolívia no mercado de gás. Gabrielli chamou a atenção para o grau de dependência entre Brasil e Bolívia no setor. Mais de 50% do gás que o Brasil consome vêm da Bolívia.

Gabrielli afirmou que ¿soluções unilaterais são inadequadas para enfrentar o problema¿, numa resposta às ameaças do presidente boliviano de retomar o controle dos campos de gás e petróleo.

¿ Se para o Brasil o mercado de gás da Bolívia é importante, para a Bolívia o Brasil também é importante como comprador do produto boliviano, como pagador de impostos, como gerador de empregos na Bolívia, como viabilizador da expansão dos negócios ¿ disse Gabrielli. ¿ Consideramos que soluções unilaterais são inadequadas para enfrentar o problema. Nós acreditamos em soluções negociadas, no encontro de pontos comuns. E esperamos que isso se viabilize.

Dilma lembra que integração também está em jogo

Ele afirmou que aceita rediscutir os preços do gás. E lembrou que a Petrobras defende seus interesses e dos seus acionistas diretamente com a YPFB, petrolífera boliviana. Os impasses políticos, acrescentou, devem ser tratados pelos governos brasileiro e boliviano.

Já a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, ponderou que um entendimento é importante não apenas para os brasileiros, mas também para a integração de toda a América do Sul.