Título: Sabenças
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 04/04/2006, O GLOBO, p. 2

Desde a semana passada a oposição ensaiava fazer do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos seu novo alvo, envolvendo-o com a quebra ilegal do sigilo do caseiro Francenildo. Deixar Lula mais só e indefeso faz parte da estratégia. A revelação de que dois auxiliares da Justiça estiveram na casa de Palocci no dia do delito veio ao encontro destas suspeitas, embora pareça ter origem na guerra particular entre os que tombaram no episódio.

Todas as narrativas dos lances que levaram à queda de Palocci registraram, na semana passada, que Thomaz Bastos fez mais de uma advertência ao presidente sobre a forte possibilidade de envolvimento direto do então ministro da Fazenda na divulgação do sigilo, ocorrida na sexta-feira, 17 de março. Já no dia 19, após o retorno de Rondônia, mandou a Polícia Federal investigar a quebra do sigilo. Dela passou a receber informações que sustentavam suas advertências. Certamente ouvira também de seu chefe de gabinete, Claudio Alencar, e do secretário de Defesa Econômica, Daniel Goldberg, relato da visita que Mattoso, ex-presidente da CEF, fizera a Palocci quando estavam em sua casa. Ali chamados, foram consultados sobre a possibilidade de a PF investigar a movimentação financeira do caseiro. A resposta negativa que teriam dado no dia seguinte pode ter precipitado a decisão de ¿vazar¿ o extrato mostrando os depósitos de R$25 mil na conta do caseiro.

Lula ouvia as advertências do ministro da Justiça e também as reiteradas negativas de Palocci. Por isso foi adiando seu afastamento, à espera de prova ou evidência. Não queria cometer injustiça. Era o que contavam auxiliares na semana passada, indignados (sincera ou fingidamente) com as negativas de Palocci.

Para a oposição, até a semana passada, o que havia contra o ministro da Justiça era o fato ¿ muito repetido pelo líder do PFL, senador Agripino Maia ¿ de que Francenildo teve seu cartão bancário fotocopiado pela Polícia Federal quando lá esteve no dia 17, pedindo desligamento do programa de proteção a testemunha, incomodado com suas restrições, que incluem não falar com a imprensa. Enquanto estava lá, sua conta foi violada. A PF pode ter informado da conta o ministro da Justiça, que informou o da Fazenda, suspeitava Agripino.

Neste final de semana a revista ¿Veja¿ revelou que os dois auxiliares de Thomaz Bastos estavam na casa de Palocci quando lá chegou Mattoso. Anteontem eles disseram à PF que não viram a entrega do extrato. Os outros dois teriam ido para um escritório.

Dizia-se ontem no governo que Mattoso, agora querendo o fígado de Palocci, acusando-o de ter destruído sua vida, foi quem providenciou a divulgação da presença de dois auxiliares de Bastos. Não para atingi-lo mas para impedir, com o surgimento de testemunhas, que Palocci tente desmenti-lo, negando ter recebido dele o extrato. Ficaria palavra contra palavra.

Outra versão dá conta de que Palocci ¿ que teve áspera discussão com Bastos no dia de sua demissão ¿ é que teria providenciado a divulgação que agora põe o ministro da Justiça no alvo, tendo que explicar a presença de dois auxiliares na cena do delito. Palocci teria criticado a conduta da PF, acusando-a de fazer corpo mole em relação ao caseiro e tudo ter feito para incriminá-lo.

Afora as certezas da oposição, pesa contra Thomaz Bastos o fato de seus auxiliares só terem prestado depoimento anteontem, depois de revelada a presença deles na cena. Se existir mesmo, como se afirma, um ofício anterior deles, oferecendo-se para depor, escapam da acusação de omissão da verdade. Mas a verdade que a oposição está buscando vai além de Thomaz Bastos. Diz respeito à ¿sabença¿, como diria o relator Serraglio, que Lula teria tido de tudo. Por isso a batalha pode estar apenas começando.