Título: TENTATIVAS DE INVESTIGAR O CASEIRO
Autor: Bernardo de la Peña
Fonte: O Globo, 04/04/2006, O País, p. 3

Assessores pensaram em usar Programa de Proteção a Testemunhas

BRASÍLIA. Assessores do Ministério da Justiça pensaram em usar o Programa de Proteção a Testemunhas para obter legalmente informações bancárias do caseiro Francenildo dos Santos. A possibilidade foi discutida pelo chefe de gabinete do Ministério da Justiça, Cláudio Alencar, e pelo secretário de Direito Econômico, Daniel Goldberg, na manhã de 17 de março, após o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, ter pedido que a Polícia Federal investigasse o caseiro. Na véspera, o então presidente da CEF, Jorge Mattoso, levara o extrato da conta do caseiro na casa de Palocci.

A proposta só não foi adiante porque na tarde daquele dia, durante encontro entre Cláudio Alencar e o diretor substituto da PF, Zulmar Pimentel, o assessor foi informado que Francenildo havia pedido para sair do Programa de Proteção às Testemunhas. Na avaliação dos assessores de Márcio Thomaz Bastos, a PF tinha por obrigação legal de se cercar de todas as cautelas para não dar guarida no programa a um eventual criminoso. Esta hipótese parecia plausível diante do relato feito por Palocci de que a imprensa publicaria reportagem mostrando que a conta do caseiro tinha recebido depósitos inexplicáveis.

Goldberg teve três reuniões com Palocci, duas delas na companhia de Alencar. O primeiro encontro, quando Palocci pediu que a PF investigasse o caseiro, ocorreu às 23h do dia 16, na casa do ex-ministro. No dia seguinte, às 11h, Goldberg e Alencar foram à casa de Palocci informá-lo que precisavam de mais dados sobre a situação financeira do caseiro para que a PF fosse convencida da necessidade de abrir uma investigação.

Delegado disse que não abriria inquérito por uma especulação

Mesmo sem receber informações novas, Alencar procurou o diretor substituto da PF para ver o que poderia ser feito. Zulmar disse que não poderia abrir inquérito com base numa especulação, que tinha dúvidas se poderia ouvi-lo depois que o STF impediu o caseiro de depor na CPI dos Bingos e após seu desligamento do Programa de Proteção de Testemunhas.

Às 17h30m do dia 17, Goldberg e Alencar voltaram à casa de Palocci para informá-lo que a Polícia Federal não investigaria o caseiro. Na saída ambos foram para a Base Aérea aguardar a chegada de Thomaz Bastos, que estava em Rondônia. Apenas às 19h de sexta-feira, o ministro da Justiça teria tomado conhecimento do pedido e dos encontros com Palocci. Eles estavam na sala vip da Base Aérea quando a assessoria do ministro lhe entregou um fax da revista ¿Época¿ exibindo o extrato bancário. O ministro e os assessores chegaram à conclusão que Palocci seria responsabilizado pela violação e Goldberg acrescentou que tinha visto Mattoso na casa de Palocci na quinta-feira. Isso significa que Bastos sabia do envolvimento de Palocci com a quebra do sigilo dez dias antes do pedido de demissão do ministro.

A partir desse instante, o ministro da Justiça parou de defender publicamente o colega e, no domingo, determinou ao diretor da PF, delegado Paulo Lacerda, que investigasse a violação do sigilo. A ordem de serviço, enviada na segunda-feira pela manhã, pede a abertura de inquérito para investigar ¿a eventual ilegalidade na obtenção de dados bancários¿ do caseiro. O inquérito foi aberto oficialmente no dia seguinte, 21 de março, quando a Coaf já tinha enviado à PF a movimentação bancária do caseiro.