Título: PMDB NO JOGO
Autor: Merval Pereira
Fonte: O Globo, 06/04/2006, O País, p. 4

O ex-governador Garotinho dificilmente conseguirá se tornar o candidato oficial do PMDB a presidente da República, mas já disseminou no partido a idéia de que é possível ter um candidato próprio com chances de vitória. O PMDB, devido às suas divisões internas, há muito tempo desistiu de ter um papel central direto no jogo eleitoral brasileiro para se transformar em um instrumento de poder regional, com papel secundário, embora fundamental, para garantir a governabilidade do país e, em troca, garantir para os seus líderes posições de destaque na administração federal.

No quadro atual, o PMDB não consegue eleger o presidente da República, mas nenhum presidente da República consegue governar sem o apoio do PMDB. O presidente Lula tentou sair dessa armadilha, caiu na dos pequenos partidos, e acabou chefiando o governo que patrocinou o mensalão, ontem tornado um fato concreto da política brasileira através da aprovação do relatório original da CPI dos Correios.

Mas o PMDB está em processo de transformação, a partir da decisão de ter uma candidatura própria à Presidência da República este ano. O sistema de prévias internas, mobilizando cerca de 20 mil eleitores em todo o país, serviu para sacudir os militantes peemedebistas, e nisso Garotinho teve papel fundamental. Venceu sem ter mais votos que o adversário, o que o enfraqueceu politicamente.

O resultado, se mostra que os caciques do partido que apoiaram o governador Germano Rigotto ainda dominam amplamente a máquina, mostrou também o interesse das bases partidárias em se verem representadas com uma candidatura nacional. Além do mais, o cenário político mostra um quadro sucessório bastante favorável a uma candidatura alternativa que quebre a polarização entre PT e PSDB.

O presidente Lula, cada vez mais isolado administrativamente, e apanhado em uma rede de denúncias variadas de corrupção que vai derrubando um a um seus principais auxiliares e líderes petistas, se encaminha para a campanha de reeleição com uma estrutura muito fragilizada, e é um candidato muito vulnerável a críticas e acusações de toda sorte, embora pessoalmente popular.

O candidato do PSDB, o ex-governador Geraldo Alckmin, começa sua campanha já tendo que responder a diversas acusações de uso da máquina pública para receber apoios políticos à sua administração paulista, e de favorecimentos pessoais a conhecidos. Acusações que, embora insignificantes diante do que vem sendo apurado na administração federal, lhe abriram um flanco que enfraquece a pretendida imagem de defensor da ética na política.

O episódio dos vestidos que Lu Alckmin recebeu de presente de um costureiro se assemelha muito ao da primeira-dama Marisa Letícia, que recebeu também vestidos e jóias para viagens internacionais e recepções. O que mostra apenas que o mesmo erro é cometido, não importando a origem social nem a filiação do político. O que prevalece nesses casos é o provincianismo e o deslumbramento com o poder.

Não é à toa, portanto, que surge a idéia de lançar a candidatura do ex-presidente Itamar Franco, que poderia representar uma terceira via nessa disputa. Dificilmente essa manobra se concretizará, mas ela sinaliza que o maior partido brasileiro já começa a querer deixar de ser ator secundário para disputar o proscênio da política nacional com um candidato que seja realmente competitivo.

Essa tendência já ficara definida no meio desse processo de escolha de um candidato próprio, quando o governador de Minas, Aécio Neves, foi sondado por líderes importantes do PMDB ¿ como o presidente do Senado, Renan Calheiros, e o senador José Sarney ¿ para se transferir para o partido e sair candidato de consenso à Presidência da República ainda este ano.

O relacionamento de Aécio com o PMDB mineiro sempre foi muito bom, e sua reeleição caminha para ter o apoio do partido em troca do apoio à candidatura de Itamar Franco para o Senado. No momento, esse relacionamento passa por uma turbulência diante da possibilidade de Itamar vir a ser lançado à Presidência, e já apareceram os defensores da candidatura própria também em Minas.

Da mesma maneira, Orestes Quércia, que lançou Itamar, pensa agora até mesmo no governo de São Paulo, quando antes já quase fechara um acordo com o PSDB paulista para ser candidato ao Senado em uma aliança branca de apoio a Serra.

Fora uma improvável união peemedebista em torno de Itamar, não será desta vez que o PMDB terá candidato próprio em condições de disputar a Presidência. Mas o vírus já está inoculado no imenso corpo do partido, e é provável que em 2010 o PMDB já surja no quadro nacional como um protagonista de peso, ainda mais se perseverarem os que ainda sonham com a adesão do governador Aécio Neves.

Sua pregação contra a centralização do poder em São Paulo agrada aos diversos líderes regionais peemedebistas, e pode ser uma alavanca à sua candidatura em 2010, quando teremos terminado 16 anos seguidos de presidentes paulistas: Fernando Henrique de 1994 a 2002; Lula de 2002 a 2006 ou 2010; ou Geraldo Alckmin de 2006 a 2010.

Se Alckmin não levar adiante um acordo, ainda não explícito, de acabar com a reeleição, Aécio pode vir a ser uma alternativa do PMDB. Caso Lula se reeleja, a disputa interna do PSDB será entre os governadores presumivelmente eleitos de Minas e São Paulo. Se o PSDB preferir a candidatura Serra, o PMDB pode ser seu destino de Aécio Neves.

Nos dois casos, o governador de Minas pode vir a ter o apoio do PT, tornando-se fortíssimo candidato. Mas essas especulações, com tanto tempo de antecedência, não passam disso, ainda mais num país tão dinâmico quanto o nosso. Ainda mais tratando-se de PMDB e de mineiros.