Título: Antes de cair, Palocci ameaçou envolver Bastos
Autor: Gerson Camarotti
Fonte: O Globo, 06/04/2006, O País, p. 12

Recado do ex-ministro da Fazenda chegou a ser repassado para Lula, segundo assessores próximos ao presidente

BRASÍLIA. Foi muito mais tensa e acirrada do que se soube a disputa interna no governo no auge do episódio da quebra ilegal do sigilo do caseiro Francenildo Costa, horas antes da demissão do então ministro da Fazenda Antonio Palocci. Segundo relato feitos ao GLOBO por várias fontes do governo, o ex-ministro chegou a fazer uma ameaça velada a integrantes do núcleo de coordenação política do governo, na esperança de contornar a crise e impedir a sua demissão. A pressão atingiu inclusive o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, no dia em que Palocci foi demitido.

Palocci envolveria Bastos por causa de assessores

Por esta versão, Palocci ameaçou envolver Bastos de forma indireta no episódio da quebra de sigilo, ao lembrar que dois assessores do ministro da Justiça se reuniram com ele para discutir a possibilidade de investigar o caseiro. Era uma referência direta ao secretário de Direito Econômico, Daniel Goldberg, e o chefe de gabinete do ministro, Claudio Alencar, que se encontraram com Palocci, a pedido dele.

¿ É melhor encerrar o caso por aí. Isso porque pode acabar envolvendo mais pessoas. Tinha duas pessoas na minha residência no dia em que o sigilo foi quebrado ¿ afirmou Palocci em tom de ameaça, segundo relato das fontes.

A afirmação de Palocci foi feita em mais de uma ocasião, no fim de semana, e repetida no dia de sua demissão. Segundo um interlocutor próximo do presidente, o recado chegou a ser repassado para Lula. A impressão de ministros do núcleo de coordenação política era de que antes de ser demitido, Palocci queria causar constrangimento ao governo tentando envolver mais personagens no episódio.

¿ Era uma tentativa desesperada de estancar as evidências contra ele ¿ resumiu um petista que testemunhou a ameaça de Palocci.

Segundo este relato, as ameaças eram feitas em tom sutil, no estilo Palocci. Era uma tentativa de envolver o maior número de pessoas no episódio. Palocci queria que Thomaz Bastos tivesse um empenho maior para que o episódio da quebra de sigilo ficasse sob controle. Na semana seguinte à quebra do sigilo, o ministro da Justiça fez uma avaliação para o grupo de coordenação política, com a presença de Palocci e Lula, de que o episódio ¿era muito grave¿.

Ainda hoje, no núcleo do governo, o clima é de guerra entre o grupo do ex-ministro Antonio Palocci e o do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Palocci fez chegar aos ouvidos de Lula sua contrariedade com a ação de Polícia Federal contra ele nos últimos dias. Palocci dizia que deveria ser mais preservado, considera que a intimação para depor na Polícia Federal o deixou muito exposto e que deveria ter um cuidado maior com a sua pessoa. Foi brindado com um depoimento reservado, em sua residência.

Bastos tem dito que Palocci ¿jogou sujo¿

Do outro lado, políticos mais próximos de Bastos relataram que o ministro da Justiça está magoado com Palocci e tem dito que ele ¿jogou sujo¿ ao tentar envolvê-lo no episódio da quebra de sigilo. Por esse relato, quando Palocci chamou os assessores do Ministério da Justiça em sua residência, ele já tinha quebrado o sigilo bancário do caseiro e queria apenas uma forma de ¿lavar¿ a informação para ter validade jurídica.

Márcio Thomaz Bastos nega que ele ou seus assessores tenham sido informados do sigilo bancário do caseiro. O presidente Lula também está preocupado com a guerra interna em seu governo e tenta evitar que essa disputa entre Palocci e Bastos aumente a temperatura da crise política. No domingo que antecedeu a demissão de Palocci, o presidente teria desabafado:

¿ Não vou mais aceitar que sejam criadas novas mentiras para sustentar outras mentiras.