Título: UM SOCORRO DE R$14,6 BILHÕES
Autor: Eliane Oliveira
Fonte: O Globo, 07/04/2006, Economia, p. 25

Pacote do governo dará recursos para agricultura, que ministro diz estar no fundo do poço

Ogoverno lançou ontem um pacote de emergência para aliviar os produtores rurais que não estão conseguindo honrar as suas dívidas nem têm capital para comercializar a safra deste ano. O conjunto de medidas pode superar R$14,6 bilhões. O setor contará, pelo menos, com R$6,9 bilhões para a comercialização da produção agrícola e serão prorrogadas, em até 12 meses, dívidas da ordem de R$7,7 bilhões. Este é o segundo ano consecutivo de socorro aos produtores agrícolas.

¿ A conta do produtor brasileiro não estava fechando. A agricultura chegou ao fundo do poço ¿ afirmou o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, após anunciar o conjunto de medidas que beneficiarão principalmente os produtores de arroz, milho, soja, trigo e algodão.

Para a comercialização da safra, será publicada, na próxima semana, uma medida provisória (MP) liberando R$1,238 bilhão para a compra de produtos agrícolas pelo governo, visando a evitar a queda de preços durante a safra, o que reduziria a renda do produtor. Mais R$5,7 bilhões serão remanejados aos bancos públicos e privados, até 30 de junho, para financiar a formação de estoques do setor privado. Os juros do financiamento ao setor agrícola são de 8,75% ao ano.

Na semana que vem, haverá reunião extraordinária do Conselho Monetário Nacional (CMN), a pedido do Ministério da Fazenda, para aprovar o alongamento das dívidas dos produtores com custeio e investimento. As prestações relativas a débitos com investimentos ¿ na maioria com recursos do BNDES ¿ serão prorrogadas por 12 meses, a contar da data do vencimento da última parcela dos contratos. São dívidas vencidas e a vencer em 2006, de R$7,2 bilhões.

Outros R$530 milhões, referentes a dívidas de custeio (para o plantio) contraídas no Banco do Brasil no fim de 2005, também terão o vencimento prorrogado em 12 meses. O volume refinanciado, no entanto, poderá ser ainda maior: produtores que conseguirem provar novas dificuldades na comercialização ou quebra de safra por problemas climáticos também terão direito a alongar débitos.

¿ Ainda não temos o número consolidado, mas abrimos possibilidade para o agricultor nessa situação ¿ explicou Rodrigues.

Para CNA, um `curativo pequeno¿

Segundo o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, o governo continua estudando medidas estruturais, como a redução de tributos e o aperfeiçoamento do seguro rural, para que esse cenário não volte a se repetir.

¿ Acreditamos que a resposta a esse conjunto de medidas será muito forte ¿ afirmou Appy.

Já o ministro da Agricultura lembrou que, no ano passado, houve uma diminuição da área plantada de 2,4 milhões de hectares. Ele destacou que as previsões do mercado apontam uma nova queda, de 3,5 milhões de hectares. As medidas conjunturais anunciadas ontem, disse Rodrigues, vão amenizar esse quadro.

O presidente da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Antônio Ernesto de Salvo, considerou positivas, mas insuficientes, as medidas anunciadas pelo governo ¿ que atende não apenas aos grandes produtores, mas também à agricultura familiar. Para Salvo, é modesta a quantia de R$1,2 bilhão que sairá do Orçamento para a comercialização, para um setor responsável por um superávit de US$35 bilhões na balança comercial e por R$200 bilhões do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto das riquezas produzidas no país).

¿ É um curativo pequeno para um gigante econômico ¿ afirmou o presidente da CNA.

Para o economista Fábio Silveira, da RC Consultores, as medidas são fundamentais para evitar que os produtores do país continuem a perder renda. Especialmente depois dos problemas enfrentados no ano passado, quando uma forte seca atingiu diversos estados brasileiros, com maior intensidade na Região Sul. Ele acredita, no entanto, que dificilmente o agronegócio terá uma recuperação capaz de compensar o fraco desempenho de 2005, quando o setor foi um dos principais entraves a um crescimento maior do PIB.

¿ Os preços internacionais continuam em baixa e o real está valorizado, tirando competitividade. O importante é investir em um bom pacote para o plantio da próxima safra, o que deverá ocorrer em meados deste ano ¿ disse Silveira.

Em 2005, gasto ficou abaixo do prometido

Para o deputado Luís Carlos Heinze (PP-RS), da bancada ruralista no Congresso, embora o governo tenha acertado ao prorrogar dívidas com custeio e investimento, os produtores ainda têm um sério problema. Há débitos com os fornecedores privados, especialmente devido à compra de insumos no fim de 2005 para plantar a safra que acaba de ser colhida. Ele disse que o número ainda está sendo levantado, mas sabe-se que ¿não é pequeno¿.

Heinze lembrou que, em 2005, o governo anunciou R$3 bilhões do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para ajudar no refinanciamento das dívidas. Mas foram gastos apenas R$820 milhões.