Título: SEM DINHEIRO PARA A VARIG
Autor: Tereza Cruvinel, Cristiane Jungblut e Geraldo Doca
Fonte: O Globo, 12/04/2006, ECONOMIA, p. 27

Lula diz que lamenta, mas não é papel do governo salvar empresa privada de falência

Entraves jurídicos e dúvidas sobre a capacidade de a Varig se recuperar mesmo com aporte financeiro fizeram o governo federal praticamente sepultar a idéia de socorrer a companhia aérea. Ontem, em almoço no Itamaraty, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que não é papel do Estado salvar empresas privadas da falência. A mensagem foi repetida ao longo do dia ¿ marcado por protestos de funcionários em várias capitais ¿ por diversos ministros envolvidos nas negociações, que se arrastam há dez dias. ¿ O governo não gosta de ver qualquer empresa ser obrigada a fechar as portas. Estamos atentos, mas não é papel do governo salvar empresas privadas da falência usando recursos do Estado. A Varig precisa implementar o plano de recuperação que firmou na Justiça, segundo as normas da nova Lei de Falências que nós aprovamos ¿ afirmou Lula. Ele disse que há oito anos ouve falar nos problemas financeiros da Varig e que ¿a cada crise os milhões crescem¿: ¿ As outras empresas estão ganhando dinheiro. A TAM está ganhando dinheiro, a Gol também. A Varig tem déficit operacional. Se tem prejuízo enquanto voa, fica difícil sair da crise. Solução eu desejo, mas ela não pode vir do governo. A sorte da Varig deverá ter capítulo decisivo amanhã. Está agendada uma reunião com os principais integrantes do governo que tratam do assunto, e nela o presidente Lula baterá o martelo sobre qualquer ofensiva para salvá-la.

Luiz Marinho critica `gestão temerária¿

Ontem, representantes da associação Trabalhadores do Grupo Varig (TGV) tentaram uma audiência com Lula e a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, mas não conseguiram. Foram recebidos pelo ministro do Trabalho, Luiz Marinho. Na Casa Civil, a posição é que há limitações jurídicas para o governo agir. ¿ Acho que qualquer solução para a Varig que não implique gasto do dinheiro público é sempre favorável. A Varig não é uma empresa estatal. Nós dependemos de acesso a dados também ¿ disse Dilma. O ministro Luiz Marinho endossou a opinião de Dilma: ¿ O Estado brasileiro não tem responsabilidade por gestão temerária. Se uma empresa privada faz uma gestão temerária, que culpa tem o Estado? O ministro da Defesa, Waldir Pires, declarou-se muito sensibilizado com a situação da Varig, mas lembrou que qualquer solução depende da Agência Nacional da Aviação Civil (Anac), que é um órgão regulador independente, não um braço do governo. ¿ Estamos ouvindo todas as áreas e temos interesse em que seja encontrado um plano capaz de preservar uma empresa como a Varig. Mas tudo dentro dos limites (legais) e lembrando que dinheiro público tem limitação ¿ afirmou Pires. Já o ministro de Relações Institucionais, Tarso Genro, afirmou em entrevista à CBN que o governo tem outras prioridades, lembrando que a Varig é uma empresa privada. Na tentativa de convencer o governo a ajudá-la, a Varig pagou ontem à Infraero R$9 milhões, referentes a tarifas de embarque não recolhidas à estatal, dos quais R$4,5 milhões em cheque pré-datado para segunda-feira. Desde o dia 5 a companhia não fazia o pagamento. Já as tarifas aeroportuárias (pouso e navegação aérea) continuam não sendo quitadas. A Infraero ameaçou cobrar antecipadamente R$900 mil por dia, mas até agora não colocou a medida em prática, alegando que a cassação de liminar que beneficiava a empresa pela Justiça do Rio ainda não foi publicada. Os funcionários da Varig também tentam uma saída. Ontem a Secretaria de Previdência Complementar (SPC) informou a outros órgãos do governo que os trabalhadores não podem usar suas reservas no fundo de pensão Aerus para investir na companhia. A proposta fora apresentada à Justiça do Rio e à Anac pela TGV, que ontem comandou em Brasília uma manifestação com cerca de 300 funcionários. Eles chegaram do Rio num avião cedido pela empresa. No desembarque, deram um abraço simbólico na aeronave e passaram pelo Congresso.

Grupo propõe corte salarial e demissões

Segundo o secretário da SPC, Adacir Reis, a legislação não permite usar dinheiro de um fundo de pensão para outra finalidade que não seja o pagamento de aposentadorias e pensões. E a proposta da TGV não tem o apoio dos trabalhadores ligados aos sindicatos nacionais dos Aeronautas e Aeroviários, que também foram a Brasília. O racha entre funcionários foi o motivo do fracasso da reunião com o ministro Luiz Marinho, que ressaltou a impossibilidade de qualquer acordo sem unidade. A proposta do TGV prevê a injeção de US$100 milhões do Aerus na Varig, carência para pagamento das dívidas com a BR Distribuidora e a Infraero, demissão de 2.900 pessoas e redução salarial de 30%. Segundo a presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas, Graziella Baggio, a proposta é absurda, pois o Aerus é o maior credor da companhia. Ela também criticou a Varig por oferecer um avião aos trabalhadores e deixar no aeroporto 240 passageiros que tiveram seus vôos cancelados e atrasados. A chegada da comissão ao Palácio foi marcada por enfrentamento com seguranças e bate-boca entre parlamentares. Enquanto a comissão entrava no Planalto, trabalhadores da Varig se concentravam na Praça dos Três Poderes, com bandeiras e faixas. No Rio, cerca de 600 funcionários fizeram manifestação no Aeroporto Santos Dumont. A governadora Rosinha Garotinho, que desembarcava de um vôo vindo de Brasília, subiu no carro de som e se comprometeu a tentar ajudar a Varig.