Título: BERLUSCONI DESAFIA ELEIÇÃO DE PRODI
Autor: Vera Gonçalves de Araujo
Fonte: O Globo, 12/04/2006, O MUNDO, p. 35

Premier italiano não aceita vitória de rival de centro-esquerda e pede recontagem

Romano Prodi diz que ganhou as eleições, e com elas o direito de se tornar primeiro-ministro da Itália, após uma vitória apertadíssima. Os resultados definitivos dão à sua coalizão de centro-esquerda, União, 49,8% dos votos para a Câmara dos Deputados, contra 49,7% da Casa das Liberdades, coalizão de centro-direita do primeiro-ministro Silvio Berlusconi. No Senado, Berlusconi tem 49,9 % e Prodi, 49,2%, mas a União é a vencedora graças a uma lei eleitoral aprovada no fim do ano passado pelo premier ¿ ironicamente, com o claro objetivo de dificultar a vitória da oposição. Berlusconi, porém, não aceitou a derrota. Depois de 24 horas de silêncio, declarou que ninguém ganhou e que é preciso recontar um milhão de votos anulados. E sugeriu uma solução como a adotada na Alemanha, depois de um empate eleitoral entre Angela Merckel e Gerard Schroeder: um governo de unidade nacional com participação da direita e da esquerda. ¿ Não acho que seja bom para o país seguir em frente numa espécie de guerra civil ¿ argumentou. Mas a reação de Prodi foi totalmente negativa. Para a União, Berlusconi está falsificando a realidade. E a convivência não é possível entre partes que acabaram de sair de uma violenta briga eleitoral. O princípio da democracia é muito simples, disse o líder de centro-esquerda: ¿ Quem ganha, leva.

Prodi promete tirar tropas do Iraque

O bloco de Prodi ganhou na Câmara por apenas 25 mil votos. No Senado, os votos dos italianos residentes no exterior foram decisivos para virar a mesa em seu favor. Prodi contará com 159 senadores, contra os 156 de Berlusconi. A pequena vantagem vem de fora: dos seis senadores eleitos nas seções do exterior, quatro são da União, um da Casa das Liberdades e um da Associação Italiana na América do Sul, que já declarou apoio a Prodi. De qualquer modo, os eleitores elegeram o Parlamento mais dividido da história da Itália. Nem nos tempos da Guerra Fria as bancadas estavam tão distantes. À esquerda, o maior partido é o DS, democratas de esquerda, herdeiros de parte do antigo Partido Comunista. Saiu reforçado também o Partido da Refundação Comunista. À direita, houve um pequeno recuo da Força Itália ¿ de Berlusconi ¿ e da Liga Norte, mas os católicos centristas da UDC estão mais fortes. A festa tardia da esquerda começou de madrugada, quando Prodi subiu num palanque na Piazza Santi Apostoli para declarar vitória. Mas foi uma festa discreta. O cansaço era demais, depois de muitas horas de incerteza. Mais tarde, ele declarou que, apesar do resultado apertado, o governo estava garantido: ¿ Podemos governar por cinco anos. Meu governo será forte política e tecnicamente. Prodi disse ainda que o centro de sua política será a Europa e confirmou sua intenção de retirar os três mil soldados italianos do Iraque. A maioria dos italianos foi contra a guerra, mas o presidente George W. Bush tinha em Berlusconi um forte aliado. No fim da tarde, Berlusconi se recusou a reconhecer a vitória de Prodi e declarou que houve ¿muitas irregularidades¿ na votação no exterior. ¿ Não acreditamos que hoje, como estão as coisas, alguém possa reivindicar a vitória ¿ afirmou. Em meio à confusão, o mercado de ações teve queda ¿ 1% em Milão. Prodi procurou afastar temores: ¿ Os mercados financeiros vão saudar esse governo com prazer. Mas o cenário político ainda não está claro. O novo Parlamento deverá tomar posse em maio. Antes de formar o novo governo, vai eleger o novo presidente ¿ o mandato de Carlo Azeglio Ciampi termina em 18 de maio. O novo presidente deverá escolher o premier. Segundo a Constituição, deve ser o líder do partido de maioria no Parlamento. Portanto, Prodi.