Título: COM BAIXOS CUSTOS TRABALHISTA E FISCAL, CHINA ROUBA ESPAÇO ENTRE EMERGENTES
Autor: Eliane Oliveira, Patricia Duarte e Gilberto Scofie
Fonte: O Globo, 17/04/2006, ECONOMIA, p. 16

País oferece ainda aos investidores estrangeiros uma sólida infra-estrutura

BRASÍLIA e PEQUIM. Um dos motores do crescimento vertiginoso da China é o poder de atrair investimentos estrangeiros, por meio de um complexo sistema de incentivos logísticos e fiscais, aliado a baixíssimos custos tributários e trabalhistas. Entre os países emergentes, a China é imbatível. Só na comparação com o Brasil, a combinação de duas variáveis dá uma idéia da vantagem competitiva do gigante asiático: o custo de um trabalhador brasileiro é quase duas vezes o da China; além disso, a carga tributária chinesa é quase a metade. Isso sem contar a infra-estrutura do país asiático, como meios de transportes e energia, bastante sólida para empresários dispostos a cruzar o planeta e fincar raízes. ¿ O mercado consumidor potencial da China, com 1,3 bilhão de pessoas, e o crescimento econômico acelerado, de quase 10% ao ano, também são fatores importantes na atração de investimentos ¿ avalia Renato Amorim, secretário-executivo do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC, formado por diversas companhias dos dois países). Os chineses investiram pesadamente para atrair empresas estrangeiras ao país. Criaram, por exemplo, 400 zonas econômicas especiais, onde a carga tributária chega a 17% e o empresário desembarca com a infra-estrutura pronta. Segundo o CEBC, há cerca de 20 grandes empresas brasileiras com unidade de produção ou escritórios na China. ¿ Começamos há muito pouco tempo a ir para lá, apenas entre 2001 e 2002. Por isso, é de se esperar que haverá crescimento neste sentido ¿ diz o secretário-executivo.

Forte crescimento fará governo aumentar tributos

Segundo Amorim, os chineses oferecem às companhias estrangeiras alíquota de 17% do imposto sobre faturamento, quase a metade dos 33% que cobram das firmas locais. Porém, com o forte crescimento econômico, essa estratégia deve ser alterada pelo governo chinês, que passará a cobrar taxas de até 25% de qualquer empresa, independentemente da origem. Na opinião de Amorim, isso não afetará o interesse das empresas brasileiras, pois só o custo baixo de produção já é um forte atrativo. Para o setor siderúrgico, por exemplo, o custo de capital é menos da metade do que se paga aqui. No caso da fabricante de aviões brasileira Embraer, o que foi uma imposição do governo chinês no passado hoje pode ser considerado um incentivo. O vice-presidente-executivo de Comunicação Empresarial da companhia, Horácio Forjaz, explica que em 2000 a China criou uma alíquota de importação para aviões que inviabilizou qualquer negócio com o país. Assim, a Embraer decidiu firmar em 2003 uma joint-venture com uma empresa local, criando a Harbin Embraer Aircraft Industry. Hoje, a empresa é a única estrangeira no ramo de jatos regionais com 50 lugares e não sofre esta concorrência de companhias internacionais justamente devido à pesada alíquota de importação. ¿ A China é um mercado estratégico que precisa ser conquistado ¿ diz Forjaz. A mão-de-obra é outro fator. No Brasil, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o trabalhador custa em média 103% do salário a mais para o empregador. Na China, são 57% a mais. A China, no entanto, estuda alterar sua legislação trabalhista para incluir benefícios que hoje não existem, como décimo terceiro salário e férias de 30 dias. Além disso, a carga tributária dos chineses é menor: cerca de 20% do Produto Interno Bruto (PIB, soma das riquezas produzidas no país em um ano), contra 40% no Brasil. A economia estável é outra qualidade. ¿ O que mais atrai os investidores? É a continuidade da política econômica, que não muda há quase três décadas. O investidor consegue enxergar a longo prazo ¿ explica o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. Outro fator que agrada aos investidores é o fato de a China ter acordos de proteção de investimentos com mais de cem países. É um fator determinante, tendo em vista que é garantida total proteção jurídica aos empreendimentos. No Brasil, por outro lado, nenhum acordo foi sancionado até agora. O movimento das empresas brasileiras que buscam produzir na China não significa, porém, que as companhias locais estejam deixando o país. Para o diretor da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Mário Salermo, os atrativos justificam a ida de empresas para a China. Mas não tiram o mérito do Brasil como pólo de investimentos: ¿ O Brasil tem uma base de multinacionais e cadeias produtivas consolidadas, coisa que a China não tem.