Título: Aerus sob intervenção
Autor: Mariza Louven/Ramona Ordoñez/Geralda Doca
Fonte: O Globo, 13/04/2006, Economia, p. 23

Secretaria extingue planos de aposentadorias do fundo de pensão dos funcionários da Varig

A Secretaria de Previdência Complementar (SPC), do Ministério da Previdência, interveio ontem oficialmente no fundo de pensão Aerus e determinou a extinção dos planos de aposentadoria complementar dos funcionários da Varig. Com a medida - tomada devido à destituição do antigo administrador e da ofensiva judicial da associação Trabalhadores do Grupo Varig (TGV) para investir recursos do Aerus na companhia aérea - os 8.285 trabalhadores da empresa na ativa deixarão de receber suas economias. Aposentados e pensionistas serão parcialmente restituídos.

Segundo números fornecidos por técnicos da entidade, a equipe da ativa participante do plano 1 (até 1995) teria direito a receber, em média, R$91 mil cada. Os ativos participantes do plano 2 (a partir de 1995) teriam a receber, em média, R$8.511 cada. Mas, segundo a legislação, todo o patrimônio do fundo, de apenas R$738 milhões, será usado para pagar os 6.792 aposentados e pensionistas.

Mesmo quem já recebe o benefício será prejudicado. O Aerus deve a eles R$2,4 bilhões, mas pagará apenas 10% do devido aos aposentados e pensionistas do plano 1 e 43% das reservas àqueles do plano 2.

Essa restituição deve demorar pelo menos três meses. Primeiro os interventores têm de se desfazer de ações e imóveis (cerca de metade dos recursos). Em seguida, será feita uma lista com os beneficiários e o respectivo montante, que será repassada à SPC. Só após a aprovação serão feitos os pagamentos.

Apenas metade do patrimônio está disponível em caixa, disse um técnico do Aerus. O pagamento aos aposentados e pensionistas (em média R$2.700) referente a março deverá ser feito no fim deste mês. Já o seguinte dependerá do interventor nomeado pela SPC, Ermo Dionízio Brentano.

Em nota, a SPC não foi clara sobre os motivos da intervenção. Informou apenas que os recursos dos planos eram insuficientes para honrar os compromissos e que a medida visava, principalmente, a evitar que o desequilíbrio aumentasse.

Entretanto, segundo fontes do órgão, a decisão se deveu à iniciativa do TGV de sacar R$225 milhões do Aerus para salvar a Varig. A operação é vetada por lei, que não permite o uso dos recursos para outros fins que não o pagamento de aposentadorias e pensões. Uma liminar de arresto de bens da Varig a favor dos empregados foi concedida na noite de anteontem pela Justiça do Trabalho do Rio, dando ao TGV poderes para administrar a empresa e tentar o saque no Aerus.

Além disso, o TGV foi responsável pela destituição de Odilon Junqueira da presidência do Aerus na sexta-feira. Diante de indícios de irregularidade na assembléia que nomeou Ricardo Lodi, a SPC mandou ao Rio dois auditores fiscais. A decisão de intervir no Aerus foi tomada na terça-feira à noite e publicada no Diário Oficial de ontem.

Segundo a nota da SPC, o Aerus chegou à atual situação devido à falta de pagamentos de sua patrocinadora, a Varig. Esta deve à entidade R$2,3 bilhões e desde janeiro deste ano não paga as parcelas, acertadas em R$9 milhões mensais pelo plano de recuperação judicial.

A liquidação dos planos de benefícios da Varig não implicará, no entanto, o fim do Aerus, que administra outros planos, como os de Transbrasil (em liquidação desde março), VEM, VarigLog, Sata, Rio Sul, Nordeste, Fundação Ruben Berta (FRB) e funcionários do próprio Aerus. A entidade, porém, será bastante reduzida, pois os planos da Varig são os maiores. A legislação do setor permite, porém, que os planos sejam reconstituídos caso haja uma mudança na situação, por exemplo com novos aportes da patrocinadora.

Apesar de os funcionários da ativa da Varig ficarem sem suas reservas agora, a companhia continuará em débito com eles. Se, em tese os primeiros a receber são aqueles que investiram na empresa durante a recuperação judicial, o que não ocorreu na Varig. Portanto, os trabalhadores receberiam primeiro. Além disso, em negociação com a SPC em 2003, a Varig deu em garantia de suas dívidas com o Aerus o crédito de R$2,2 bilhões com a União devido ao congelamento tarifário, ação ganha no STJ.

Para o coordenador do TGV, Márcio Marsillac, faltou sensibilidade à SPC:

- No mínimo, é muita falta de sensibilidade. A entidade já está desquilibrada há muito tempo. Qual é o fato relevante?

Já para a presidente do Sindicato dos Aeronautas, Graziella Baggio, a decisão foi acertada porque os recursos estavam em risco.

- Eu pretendia fazer uma auditoria contábil e atuarial, e o corte das mordomias da diretoria do Aerus. Isso acarretou a intervenção do fundo. Eles têm medo de que a gente encontre o quê? - disse Lodi, que comandou o Aerus por apenas 12 horas. - O governo passa a ser o único responsável pela solução da crise da Varig.

A decisão não é inédita. Hoje estão sob intervenção cinco fundos de pensão e 12 já foram liquidados, como Previ Banerj e Mappin.

Para o analista de aviação Alexandre Garcia, da corretora Ágora Senior, a Varig tem todos os vícios de algumas estatais, como excesso de funcionários, salários acima da concorrência e o hábito de recorrer aos cofres públicos quando está em dificuldades:

- O que levou a essa situação foi o acúmulo de erros dos gestores.

O presidente do Conselho Regional de Contabilidade do Rio, Antonio Miguel concorda que houve má gestão, mas diz que o governo deveria interferir para viabilizar uma solução. Já o advogado João Luiz Nóbrega, da Nóbrega Direito Empresarial Advogados - que tem a Varig como cliente - diz que a dívida da empresa se deve em parte ao congelamento das tarifas, cujo valor chegaria a R$4,5 bilhões.

COLABORARAM Mariza Louven e Ramona Ordoñez

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