Título: Sem demagogia
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Fonte: O Globo, 14/04/2006, Opinião, p. 6

Àprimeira vista, são animadoras as propostas que constam do anteprojeto do novo Plano Diretor do Rio, especificamente com vistas à contenção do processo de favelização e ao reassentamento dos moradores em áreas de risco e externas aos chamados ecolimites. É impossível, no entanto, conter o ceticismo diante de mais uma declaração de propósitos, por mais bem montado e criterioso que seja o novo texto. Porque muitos bons projetos já foram elaborados anteriormente com os mesmos objetivos, sem atingir resultados concretos.

A favelização é um mal nacional, que se antes se restringia às grandes metrópoles, hoje não poupa praticamente cidade alguma no país. Nova Friburgo, como mostrou reportagem do GLOBO, é um exemplo desse processo de degradação, que tem como principal fator uma migração maciça do campo para as cidades e é alimentado pela ausência de uma política habitacional consistente para os mais pobres e pela expansão populacional que deveria ser contida por um planejamento familiar infelizmente inexistente.

A lei do Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social, aprovada pelo Congresso, é um dos instrumentos que já foram criados, e que podem funcionar na medida em que estiverem disponíveis os necessários recursos. Mas o ponto de partida será sempre a capacidade de decisão e uma política enérgica dos governantes para evitar loteamentos clandestinos, impedir a ocupação desordenada de encostas e até, quando preciso, proceder à remoção de moradias.

É sintomático que na mesma Nova Friburgo casa populares doadas pela prefeitura tenham sido alugadas por seus donos, que passaram a morar em barracos ¿ comprovando que não basta criar programas bem-intencionados para os mais pobres se ao mesmo tempo não se evitar o aparecimento das favelas e, onde elas já existem, delimitá-las e impedir a todo custo o seu crescimento. A alternativa demagógica é permitir que prossiga a deterioração contínua dos centros urbanos.