Título: CONDENADO A 228 ANOS DE PRISÃO, CORONEL FICA SOLTO
Autor: Ismael Machado
Fonte: O Globo, 16/04/2006, O PAÍS, p. 14

Pantoja comandou massacre de Eldorado dos Carajás há dez anos e hoje está livre graças a pedido de novo júri

BELÉM. Há dez anos, Eldorado dos Carajás, a 672 km de Belém, entrou para a História como palco do mais emblemático conflito pela posse de terras no Brasil. Dezenove trabalhadores rurais ligados ao MST foram assassinados por policiais militares em 17 de abril de 1996. A condenação do coronel da PM do Pará Mário Colares Pantoja a 228 anos de prisão passou inicialmente a impressão de que a Justiça brasileira havia conseguido se livrar da fama de impunidade que a persegue. Acusado de comandar 151 homens no confronto, Pantoja recebeu, à época, a notícia num hospital. Minutos depois do anúncio da sentença, foi lida a absolvição do capitão Raimundo Almendra, o número dois na hierarquia da operação. Os soldados foram absolvidos. Meses depois o coronel foi posto em liberdade, após pagamento de fiança. Pantoja se beneficiou do pedido de novo julgamento. Atualmente mora em Belém, está aposentado e tem um filho também policial militar. No Comando da PM em Belém, o assunto é tratado com reserva. Da Corregedoria ao Setor de Comunicação, ninguém fala abertamente sobre a aposentadoria. ¿ Ele está muito melhor que os mutilados e não deveria estar recebendo nosso dinheiro. Ele ganha dinheiro público e as famílias que foram vitimadas não recebem nada ¿ diz a presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-PA, Mary Cohen. ¿ Não há nada irregular no benefício. O coronel Pantoja tem esse direito ¿ diz a advogada Maracélia Oliveira. Hoje cerca de 70% dos sobreviventes do massacre moram no assentamento 17 de Abril, antiga fazenda Macaxeira, pivô do conflito. O assentamento tem 52 pequenos núcleos, de cinco a dez famílias cada. Os assentados vivem da produção de arroz, feijão e bananas e criam gado, porcos e galinhas. Se por um lado a organização permitiu que o assentamento se mantivesse, por outro o convívio entre vítimas é um empecilho para que as seqüelas psicológicas sejam curadas. ¿ Meu maior sonho é esquecer o massacre, mas não dá. Quando a gente anda na rua, encontra uma viúva, um órfão, um mutilado. A gente não passa um dia sem falar do caso. Não dá para esquecer ¿ diz o agricultor Josimar de Freitas.