Título: CNI: AUMENTO DE GASTOS AMEAÇA META FISCAL
Autor: Flávia Barbosa e Regina Alvarez
Fonte: O Globo, 18/04/2006, Economia, p. 21

Estudo diz que liberação de verba pelo governo Lula põe em risco superávit primário de 4,25% do PIB este ano

BRASÍLIA. A disposição política do governo Luiz Inácio Lula da Silva de abrir as torneiras dos cofres públicos a partir do segundo semestre de 2005 ameaça seriamente o cumprimento da meta de superávit primário ¿ economia para o pagamento de juros da dívida ¿ de 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB) estabelecida para este ano. O alerta foi feito ontem pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), que teme a desorganização das contas da União e a limitação do espaço para a redução da carga tributária e o aumento dos investimentos. No curso atual, as projeções indicam que a União fará superávit de 2,05% em 2006, contra o objetivo declarado de 2,45%.

Um estudo divulgado pela entidade aponta que as despesas obrigatórias ficaram estáveis entre julho do ano passado e fevereiro deste ano. No entanto, houve aceleração do ritmo de expansão média mensal de todos os gastos que dependem da vontade do governo ¿ como os de custeio. Em contrapartida, as receitas administradas pela União mantiveram a taxa de crescimento.

O descasamento levou a uma redução de 0,82 ponto percentual no superávit acumulado em 12 meses, sendo 0,51 ponto percentual uma contribuição do Governo Central (Tesouro, INSS e Banco Central).

Como resultado, os 5,20% do PIB economizados em julho do ano passado passaram a 4,38% em fevereiro deste ano. A questão é ainda mais urgente porque sabe-se que estados e municípios também já começaram a relaxar no esforço fiscal.

¿ No ano eleitoral, é normal que haja uma concentração de gastos nos primeiros meses do ano. Mas se o governo quiser cumprir a meta de superávit primário vai ter que restringir os gastos de custeio e investimento daqui em diante ¿ afirma o economista Mário Sérgio Carraro Telles, do Departamento de Pesquisas Macroeconômicas da CNI, autor do estudo sobre as contas públicas.

Ritmo de expansão de gastos chega a quadruplicar

Segundo dados do Tesouro Nacional e do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi) compilados por Telles, o ritmo de crescimento das despesas de custeio ¿ como a manutenção da máquina administrativa e programas como o Bolsa Família e o Merenda Escolar ¿ quadruplicou, passando de 0,3% ao mês entre janeiro e julho do ano passado para 1,2% de agosto a fevereiro último.

Também houve um salto nos gastos com investimentos, cuja variação média passou de -0,7% (ou seja, contração de despesas) nos primeiros sete meses de 2005 para um aumento médio mensal de 2,2% desde agosto do ano passado. A aceleração dos gastos que dependem da vontade do governo coincide com a chegada da ministra Dilma Rousseff à Casa Civil.

A preocupação da CNI e de outros analistas reside no fato de, a partir de agora, as despesas obrigatórias ¿ especialmente com benefícios previdenciários e o funcionalismo ¿ passarem a crescer. A pressão deste lado soma R$7,5 bilhões em 2006, a partir do aumento real expressivo do salário-mínimo, dos reajustes concedidos a algumas categorias do funcionalismo e da contratação prevista de 28 mil servidores.

¿ Existe margem para cortar os gastos correntes, mas é preciso vontade política. A decisão política neste momento é o que mais importa ¿ disse Telles.