Título: STF TEM QUASE 200 MIL PROCESSOS PARA JULGAR
Autor:
Fonte: O Globo, 19/04/2006, O País, p. 8

Número excessivo de ações atrasam julgamentos; entidades criticam foro privilegiado

BRASÍLIA. O Supremo Tribunal Federal tinha no fim de março 199.503 processos para julgar. Só no mês passado deram entrada 14.222 ações, das quais 1.088 foram parar nas mãos do ministro Joaquim Barbosa. Na condição de relator da denúncia da Procuradoria-Geral da República contra 40 ex-ministros, deputados, assessores e empresários acusados de envolvimento com o mensalão, Barbosa é um crítico do foro privilegiado e entende que o tribunal não tem estrutura para apreciar processos criminais como o do mensalão.

Segundo ele, a razão de ser do Supremo é garantir que a Constituição seja cumprida. Como última instância da Justiça, sua vocação, raciocina Barbosa, é julgar recursos e não ações penais que envolvam interrogatórios e produção de provas. Daí a sua convicção de que o foro privilegiado acaba abrindo caminho para a impunidade.

Em fevereiro, foram protocolizados 16.346 processos. O número de ações distribuídas aos onze ministros, porém, alcançou 19.346. Isso porque foram repassadas ações que haviam dado entrada no ano passado.

Barbosa disse anteontem que a denúncia do mensalão deverá levar anos para ser julgada, dado o alto número de denunciados e procedimentos processuais, sem falar em recursos protelatórios. O STF informou que o tempo médio de tramitação de decisões monocráticas, tomadas por um único ministro ¿ liminares e hábeas-corpus, por exemplo ¿ é de 315 dias. Decisões colegiadas do plenário ou das turmas de julgamento levam em média 483 dias.

Em março, o recém-chegado ministro Ricardo Lewandowski, recebeu 3.821 processos, a maior cota do mês, uma vez que herdou ações do ex-ministro Carlos Velloso, a quem substituiu. O ministro mais antigo do tribunal, Sepúlveda Pertence, ganhou 1.144 novas ações para analisar. A atual presidente da corte, Ellen Gracie, recebeu a menor cota do mês: 967.

Entidades também criticam o foro privilegiado

Assim como Barbosa, entidades da área jurídica criticaram o foro privilegiado.

¿ O foro privilegiado está se transformando num instrumento de ineficácia da decisão judicial. Neste momento, ele não se justifica mais ¿ disse a presidente interina da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Andréa Pachá.

¿ Não é concebível que, numa democracia como a nossa, deputados e ministros tenham um foro diferente do atribuído a qualquer cidadão. A Justiça é diferente ou trata diferentemente as pessoas pelo cargo que ocupam? ¿ disse o presidente da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), José Nilton Pandelot.

O presidente do Conselho Federal da OAB, Roberto Busato, é favorável ao foro privilegiado apenas em casos excepcionalíssimos, como ações que envolvam diretamente o presidente da República.

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, Nicolao Dino, é contrário ao foro privilegiado. Ele lembrou que tramita na Câmara proposta de emenda constitucional para devolver o privilégio a ex-autoridades, como havia sido estabelecido durante o governo Fernando Henrique e depois anulado pelo Supremo:

¿ Se o foro privilegiado é incompatível com o princípio republicano, mais ainda para quem deixou de ocupar cargo.

Deputados da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara se dividiram: uns elogiaram a posição de Barbosa, outros defenderam o foro especial.