Título: Dança imóvel
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 21/04/2006, O GLOBO, p. 2

O ministro da Justiça foi à Câmara, deu fartas explicações sobre sua atuação no caso da quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo, apoiando-se na atuação de uma Polícia Federal que, sob seu comando, em poucos dias desvendou a trama e botou os culpados na rua. Não convenceu a parte da oposição que não queria ser convencida, embora esta não tenha, também, conseguido demonstrar que ele incorreu na ilegalidade.

Mas outros baixaram o tom, o que se traduziu no esvaziamento do espetáculo do meio para o final, em sinal de que dali não sairia nenhum estrondo. O governo queria encerrar o assunto mas a bola agora está com o Senado, que poderá ou não pedir novas explicações. O ministro avisou que fica e tratou de preservar Lula, que segundo ele desde o início exigiu rigor na apuração, agindo quando ficou claro o envolvimento de Palocci. Contentou o Planalto, mas não a oposição.

O líder pefelista Rodrigo Maia e o tucano Jutahy Júnior, que abriram a sabatina com uma saraivada de ataques, entraram e saíram com as mesmas convicções. Não arrancaram contradições ou incongruências do depoente mas não mudaram de opinião. Jutahy está convencido de que foi a Polícia Federal, através de Márcio Thomaz Bastos, que forneceu a Palocci o número da conta bancária do caseiro na CEF, depois de ter fotocopiado seu cartão bancário, horas antes da quebra do sigilo. Para quem ocupa o ministério da Fazenda, dispondo de tantos instrumentos e disposto a usá-los, descobrir onde um cidadão tem conta bancária é coisa que dispensa ajuda policial. Contra a convicção do tucano, Thomaz Bastos brandiu a independência e a eficiência da Polícia Federal, cujas investigações derrubaram em poucos dias aquele que era o segundo homem mais forte do governo Lula. Que era e continua sendo seu amigo, destacou. Inútil. O líder do PSDB segue pedindo sua demissão e o do PFL promete uma denúncia contra o ministro à comissão de ética pública. Para Rodrigo, o crime está no fato de ter indicado e apresentado o advogado Arnaldo Malheiros a Palocci, já então sob suspeita.

Surpreendido pelo ataque inicial dos jovens falcões, Thomaz Bastos fica devendo ao líder da minoria, José Carlos Aleluia, a intervenção mais racional da oposição, com perguntas encadeadas e bem formuladas sobre os fatos centrais do episódio. Isso permitiu ao ministro recobrar a segurança e reorientar o depoimento, buscando explicar os pontos mais obscuros. Outros membros da oposição entretanto exibiram imenso despreparo, fazendo perguntas confusas ou mostrando-se mal informados. Talvez lhes conviesse a desinformação.

Se a oposição não se preparou, os governistas menos ainda. Poucos foram úteis ao ministro com argumentos que fortalecessem suas explicações. Uma exceção, Antonio Carlos Biscaia, com uma intervenção esclarecedora. Já no final, o presidente do PT, Ricardo Berzoini, apareceu para endossar a fala de Thomaz Bastos sobre a conduta exemplar da Polícia Federal. Lembrou que no governo passado foi afastado um delegado que investigava Ricardo Sergio (ex-diretor do Banco do Brasil acusado de manobrar o processo de privatização das teles). E que Roseana Sarney foi vítima de uma operação da PF supostamente armada para desestabilizar sua candidatura presidencial em alta, ao encontrar um gordo dinheiro de campanha não contabilizado na sede da empresa Lunus. Mas isso também foi espuma, não esclarecimento. O que se seguirá agora é apenas o uso político do episódio por quem tiver mais competência.