Título: SALAS VAZIAS E FALTA DE EXPLICAÇÃO
Autor: Dimmi Amora
Fonte: O Globo, 28/04/2006, O País, p. 3

ONGs que receberam milhões do governo Rosinha se calam sobre contratos

Silêncio, respostas atravessadas, desinformação. É difícil conhecer o que fazem as ONGs contratadas pelo governo fluminense. Ontem, quatro delas, com endereço no Centro do Rio, foram visitadas pelo GLOBO. Em duas, as salas estavam aparentemente vazias. Nas demais, funcionários se limitaram a informar que os responsáveis não se encontravam no momento.

Beneficiada por repasses de quase R$20 milhões só no exercício de 2004, o Instituto de Qualidade Social (Iqual) foi a primeira ONG visitada. O endereço extraído da relação de empenhos do Sistema de Administração Financeira para Estados e Municípios (Siafem), Avenida 13 de Maio 23, sala 1802, é hoje ocupado por um escritório de advocacia. O porteiro informou que a ONG deixou o local há dez anos.

Pelo cadastro de pessoa jurídica da Receita Federal, porém, foi possível encontrar o Iqual. A ONG ocupa uma sala (316-A) de um prédio público apinhado de organizações sociais na Avenida General Justo 275, antiga sede da Legião Brasileira da Assistência (LBA), hoje estadualizada. Mas a descoberta foi inútil. Dois funcionários, um deles identificado como Claudinei, informaram que a única pessoa capaz de falar sobre a Iqual era Nilton Novaes, ausente naquele momento. Ficaram de ligar. Nem sinal deram.

Mais tarde, uma mulher, já irritada, disse que o expediente na ONG havia terminado.

As dificuldades foram as mesmas na Fundação Oscar Rudge. O endereço registrado no Siafem (Avenida Almirante Barroso 90, grupo 601) estava correto. Mas ninguém da ONG quis falar, à exceção de um funcionário que disse que a fundação atuava no projeto 192, Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). Mais do que isso, só por intermédio do superintendente, João Mário, segundo ele, também ausente.

Um detalhe, verificado em duas placas pregadas na parede, chamava a atenção: naquele mesmo endereço funcionou até certo tempo a Fundação Médica Pró-Into, administrada por Joaquim Pires e Albuquerque Pizzolante. A entidade foi acusada pelo Ministério Público Federal de permitir, entre 1997 e 2001, um esquema de desvio de próteses do Instituto de Traumato-Ortopedia (Into), inicialmente em benefício dos pacientes de planos de saúde, mas sobretudo voltado a cobrar por essas próteses usadas por pacientes privados.

As próteses eram adquiridas sempre das mesmas empresas de fachada ¿ a maioria administrada por laranjas ¿ e não eram entregues ao instituto. Herdeira da Pró-Into, que funcionou até 2002 no mesmo endereço, a Fundação Oscar Rudge, entre janeiro e abril deste ano, de acordo com o Siafem, recebeu do governo R$3,597 milhões para execução de ¿serviços técnicos especializados, recrutamento, treinamento, aperfeiçoamento, pessoal com provisão para o programa de emergência em casa, atendimento domiciliar, e de emergência da Zona Oeste e região metropolitana¿.

Nos outros dois endereços visitados, nada foi encontrado. Na Rua da Quitanda 50, sala 701, onde deveria funcionar o Instituto Nacional de Políticas Públicas (INPP), ninguém atendeu. O porteiro informou que a sala está vazia há quatro anos. No Instituto Brasil Cidadão (Avenida Rio Branco 277, sala 505), último a ser visitado, no fim da tarde, mais uma vez a sala estava vazia.