Título: GALERIA ASSUSTADORA DE TIPOS
Autor: Fernanda Pontes
Fonte: O Globo, 29/04/2006, Rio, p. 16

Personagens do livro comandam torturas e execuções

A coleção de personagens que compõem o livro ¿Elite da tropa¿ parece saída de uma imaginação delirante. Infelizmente, eles têm como inspiração figuras reais. A certa altura, um secretário de Segurança Pública diz, a respeito de seus colegas: ¿A gente tem que ser paranóico, doente mental, pra imaginar a galeria fantástica de pervertidos... Mesmo assim, mesmo pondo pra funcionar a mais patológica das fantasias, a gente não vai conceber o grau de degradação, sacanagem e traição dessa corja¿.

Nas 315 páginas do livro, surgem tipos como um professor do Bope que, ao ver um aluno cochilar após exaustivas sessões de treinamento, obriga que ele fique de cócoras sobre um tronco. Em seguida, pega uma granada, puxa o pino e põe o artefato em sua mão direita ¿ se em algum momento ele cansasse todo o grupo iria pelos ares.

Há o capitão que subia a favela com uma cadeirinha de armar, como a dos diretores de cinema. Certa vez, os soldados prenderam um traficante e levaram-no ao oficial, que encenou um julgamento. Ele fez o papel do juiz e um policial interpretou o promotor. O bandido teve que se defender sozinho. Ao fim do julgamento, que transcorreu cheio de rituais, como se todos estivessem no tribunal, e não no morro, o rapaz foi condenado à morte e executado com um tiro na testa.

Também há o sniper ¿ especialista em tiros à distância ¿ que está doido para estrear sua arma nova e, descumprindo a ordem de seu superior, atira num suspeito. Só que ele erra o alvo e, em vez de acertar a cabeça, atinge outra parte do corpo. ¿O cara estava vivo, chorava e apertava a região pélvica. Alguns metros adiante, os bagos boiavam numa poça de sangue, espalhados, estilhaçados¿, diz o narrador do livro.

Um dos tipos mais bizarros é o tenente que empala traficantes com uma vassoura. Numa noite, ele prende todo mundo em uma boca-de-fumo e obriga que as meninas da favela façam sexo oral com os bandidos. Quem falhasse, apanhava. Três líderes da comunidade foram dar queixa ao comandante. O tenente descobriu, executou um deles e avisou que os outros teriam o mesmo destino se insistissem na denúncia.

As histórias se sucedem, cada qual mais assustadora que a outra, como a dos policiais que executam dois rapazes algemados e, ao descobrir que perderam a chave das algemas, arrebentam as mãos e os braços das vítimas para não deixar pistas.

Ou o caso de um informante, ligado ao deputado estadual Amarildo Horta (nome fictício), que está lotado na delegacia de Botafogo. ¿Ele tá grampeando tudo que é artista, mulher de secretário, filho de autoridade, jogador de futebol, pra ver se garimpa alguma coisa que renda uma graninha pra ele e, principalmente, que renda ao Amarildo um movimento pesado no xadrez político. Quem diz Amarildo diz o governador, porque eles são unha e carne¿, conta um personagem no livro.

Exagero?

¿ Nós fomos brandos ¿ brincou o capitão da PM André Batista, um dos autores do livro, em entrevista realizada na quarta-feira. ¿ A verdade é muito pior.