Título: LULA DIZ QUE PODE FINANCIAR `SALVAÇÃO¿ DA VARIG
Autor: Flávio Freire, Geralda Doca e Erica Ribeiro
Fonte: O Globo, 29/04/2006, Economia, p. 29

Presidente reafirma que não haverá dinheiro público na empresa. Governo quer que parte boa da companhia vá a leilão

SÃO PAULO, BRASÍLIA e RIO. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva admitiu ontem que o governo federal poderá financiar a ¿salvação¿ da Varig, mas não detalhou o possível plano de recuperação da companhia. Lula disse, no entanto, que o governo não colocará dinheiro público para levantar financeiramente a empresa, já que, segundo ele, não se pode resolver o problema com o coração:

¿ Tenho dito publicamente que o governo não vai colocar dinheiro público. O que podemos fazer é financiar a salvação da Varig desde que a empresa cumpra seu papel. A Varig, como outras empresas do Brasil, virou uma espécie de paixão nacional, mas não podemos tratar essas coisas com o coração, e sim com racionalidade de uma empresa privada.

A decisão de salvar a Varig partiu de Lula e foi informada anteontem aos credores públicos pela ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. No encontro com representantes de Banco do Brasil, BNDES, BR, Infraero, Ministério da Fazenda e os ministros da Defesa,Waldir Pires, e do Trabalho, Luiz Marinho, Dilma determinou que os órgãos envolvidos falem a mesma língua e colaborem para evitar a falência. Foram orientados a aprovar a cisão na reunião de credores, marcada para terça-feira, e dar a carência de que a empresa precisa para ter fôlego.

Segundo fontes, Dilma teria ficado irritada com as explicações dos técnicos da BR sobre a recusa em dar crédito. Ela disse que, se for preciso, o governo fará acordo com órgãos como Tribunal de Contas da União, Ministério Público Federal e Congresso.

O presidente disse ontem ter ficado satisfeito com a proposta que está nas mãos do juiz da 8ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio, Luiz Roberto Ayoub, que acompanha o processo de recuperação judicial da Varig. Ayoub informou que quatro propostas serão analisadas na assembléia de credores.

Entre elas estão a da VarigLog, ex-subsidiária da Varig, que pretende comprar a companhia por US$400 milhões e dividi-la em uma empresa saudável e outra com o passivo. Outra proposta é a do consultor Jayme Toscano, que diz representar investidores estrangeiros interessados em injetar US$1,9 bilhão.

A consultoria Alvarez & Marsal, reestruturadora da Varig, também fez sua proposta. Segundo Marcelo Gomes, diretor da consultoria, o plano foi desenhado com o governo e Ayoub. Prevê a criação da Nova Varig, em que ficariam os vôos domésticos. Na antiga Varig, que ficaria com o passivo, estariam os internacionais. O BNDES financiaria o capital de giro da nova empresa até a realização de um leilão. Gomes terá reuniões neste fim de semana com executivos do banco para discutir o financiamento de capital de giro de até US$100 milhões.

Ações da empresa subiram 167% em duas semanas

As propostas da VarigLog e de Toscano não são recomendadas pelo governo. O Executivo quer que a Nova Varig fique com brasileiros. Toscano não revelou a origem dos recursos e a Volo do Brasil, que comprou a VarigLog, ainda não teve o negócio aprovado por suspeitas de que o capital seja todo americano.

A idéia, contaram interlocutores, é incentivar que as aéreas nacionais participem do leilão. Para financiar esses investidores, o BNDES entraria com US$250 milhões. Na proposta da Agência Nacional de Aviação Civil e do Judiciário, para manter a Varig Internacional será preciso obter no leilão US$600 milhões.

Ontem, Ayoub recebeu ainda o projeto da associação Trabalhadores do Grupo Varig (TGV), que também prevê a divisão da empresa, além do uso dos recursos do fundo de pensão Aerus e da redução de salários.

Na reunião liderada por Dilma, também ficou decidido que os órgãos agilizarão a criação dos fundos de investimentos e participações ¿ uma engenharia financeira para tratar do passivo que ficará com a Varig Internacional. Além da transferência das ações da Fundação Ruben Berta para um bloco de controle, serão contabilizados outros ativos da empresa, como o encontro de contas entre o que a Varig tem a receber da União com a indenização de perdas causadas pelo congelamento tarifário nos anos 80 e o que deve ao governo, e créditos relativos ao ICMS devidos pelos estados.

Outra preocupação do governo é manter a Justiça do Trabalho longe do processo, para evitar que eventuais recursos aportados por investidores sejam bloqueados para pagar direitos trabalhistas.

As ações da companhia subiram 167,24% nas últimas duas semanas, em meio a especulações sobre uma eventual ajuda do governo. Os papéis, que têm baixíssima liquidez no mercado, saltaram de R$0,58 para R$1,55. Na última semana, a valorização das ações foi de 59,79% e apenas ontem, de 33,62%.