Título: A trégua petista
Autor: Ilimar Franco
Fonte: O Globo, 01/05/2006, O GLOBO, p. 2

Às vésperas das eleições presidenciais, os petistas abriram mão de debater suas divergências internas durante o XII Encontro Nacional do PT. A tese-guia que vai servir de base para a elaboração do programa de governo foi aprovada sem maiores discussões. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva se impôs e obteve a aprovação da política econômica e de uma ampla política de alianças.

A política econômica baseada na meta de inflação, no superávit primário e no câmbio flutuante não foi questionada pelos petistas. Nem mesmo pelos representantes da esquerda partidária. Estes grupos preferiram silenciar, mas o incômodo interno persiste. Ele foi explicitado em resolução pela anulação da privatização da Vale do Rio Doce, derrotada por 358 a 305 votos. O presidente Lula recebeu o aval do partido para manter a política de estabilidade e de ajuste fiscal, incluindo o apoio ao superávit primário de 4,25%.

Nem mesmo a política de alianças suscitou maiores emoções. Foi aprovada uma resolução óbvia que exclui apenas alianças com os partidos de oposição, o PSDB e o PFL. O presidente Lula recebeu um cheque em branco do partido para montar as alianças que considerar necessárias à sua reeleição. A decisão foi coerente, de acordo com um dirigente petista: com o envolvimento do próprio partido no escândalo do mensalão, não faz sentido vetar acordos com o PTB, o PL e o PP. Esse debate não lembrou em nada a calorosa polêmica sobre uma aliança com o PL e a escolha de José de Alencar para vice, ocorrida em 2002.

Mas nem tudo foram flores. Uma ala do partido, ligada ao ex-ministro José Dirceu, fez pressão para que não fosse aprovada a investigação sobre o envolvimento de petistas no escândalo do mensalão. Mas prevaleceu a posição dos que, como o ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro, defendem a investigação. Ela ocorrerá depois das eleições de outubro para evitar, de acordo com o presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP), seu uso pela oposição.

O presidente Lula também aproveitou o encontro para dar forma a seu discurso eleitoral. Para se contrapor ao bordão do candidato da oposição, Geraldo Alckmin, de que fará um ¿choque de gestão¿, afirmou: ¿O Brasil precisa é de choque de inclusão social, de política pública para cuidar do povo pobre desse país¿. O presidente, seguindo à risca sua estratégia, não perde oportunidade para sedimentar seu compromisso com os mais pobres. A maioria destes eleitores manteve o apoio ao presidente e ao governo depois de 11 meses de denúncias de corrupção. Segundo as pesquisas, mais da metade do eleitorado que forma o núcleo duro pela reeleição (que corresponde a um terço dos votos) é das camadas mais pobres.