Título: IPHAN FAZ INVENTÁRIO DE BENS TOMBADOS ROUBADOS
Autor: Jacqueline Costa
Fonte: O Globo, 30/04/2006, Rio, p. 29

Lista das 538 obras de valor histórico desaparecidas no Estado do Rio pode ajudar na recuperação das peças

¿Cavalo em atitude de marcha¿, em terracota, da Dinastia Tang (907/1127). A descrição é de apenas uma das 538 peças que integram o acervo de bens tombados no Estado do Rio pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e que foram furtadas ou roubadas ao longo das últimas décadas. Na atual lista, o Rio ocupa um infeliz primeiro lugar, com mais da metade das obras roubadas em todo o país: estão desaparecidos no estado 490 objetos de acervos religiosos e 48 peças de museus. São obras de arte, documentos e objetos de valor histórico que fazem parte da memória do país.

Antes mesmo do roubo das telas de Monet, Dalí, Matisse e Picasso ocorrido às vésperas do carnaval, o Museu da Chácara do Céu já estava no topo da lista, com 32 peças e nove telas furtadas em 3 de maio de 1989. Entre elas, três obras de Portinari, recuperadas 20 dias após o ocorrido. Também foram levadas mais duas peças chinesas em terracota e 29 de prata, sendo oito castiçais, quatro bacias para lavar mãos, tinteiros, paliteiros e crucifixo.

Igreja no Centro teve 250 peças levados por ladrões

Para tentar reaver esses e outros objetos, o Iphan começou a inventariar todas as peças do Banco de Bens Procurados. Das 423 peças da capital, 250 foram furtadas de um só lugar: a Igreja da Ordem Terceira do Carmo, no Centro. Em 1993, o templo foi praticamente saqueado: foram levados móveis, castiçais, tocheiros, pinturas e até um pesado lampadário. Um dos destaques dessa lista é uma arandela entalhada em madeira, assinada por Mestre Valentim. Ela integrava a obra de talha que reveste toda a capela do noviciado. Nem a altura da peça, 1,20 metro, inibiu os ladrões.

Do Museu Nacional foi furtado, em 24 de abril de 2002, um muiraquitã (uma peça em madeira, em forma de sapo). Do Museu da República, foi levada, em maio de 2000, uma peça em cristal Baccarat, que pertence à coleção da Presidência da República. No interior do estado, o banco do Iphan contabiliza hoje 115 objetos, sendo 90 de Angra dos Reis, 13 de Paraty, oito de Petrópolis, um de Niterói, um de Mangaratiba, um de Itaboraí e um de Duque de Caxias.

¿ É muito importante atualizar e divulgar o nosso banco de bens procurados. Acredito que muitas pessoas têm peças tombadas em casa, sem ter consciência de que foram roubadas. Queremos mostrar quais são as peças do acervo do Iphan para tentar localizá-las ¿ disse o presidente do Iphan, Luiz Fernando de Almeida, que tomou posse no início do ano.

Luiz Fernando lembra a importância do inventário desses bens nas instituições a que pertencem. Entre outras medidas, inventariar significa fotografar, descrever as peças detalhadamente, informar a sua exata localização etc. Por todo o país, há cerca de 500 mil bens móveis tombados pelo Iphan. Nos últimos 20 anos, apenas cem mil foram inventariados. No Rio, há 80 mil bens móveis tombados, mas só 20 mil passaram por inventários.

O delegado Deuler Rocha, da Delegacia de Repressão a Crimes contra o Meio Ambiente e o Patrimônio Histórico (Delemaph) da Polícia Federal, responsável pelas investigações de roubos ou furtos de qualquer objeto histórico de valor cultural inestimável, também acredita que a divulgação das imagens das peças desaparecidas pode ajudar na recuperação:

¿ Acho que muita gente tem na estante da sala uma obra que foi roubada, sem saber da sua procedência. Atualmente, as obras sacras são as mais recuperadas. No último ano, a Polícia Federal conseguiu reaver 142 peças muito significativas. Algumas ainda estão aguardando identificação para serem entregues aos donos, sejam museus ou igrejas. Um caso curioso foi o de um padre que trouxe uma cruz para a delegacia e ela encaixou-se perfeitamente na figura de Jesus que havia sido roubada. Ele se emocionou ao ver que a peça era a de sua igreja ¿ disse o delegado.

Peças roubadas de museu em 1989 foram recuperadas

No roubo em maio de 1989 no Museu da Chácara do Céu, foram levadas oito telas, uma tapeçaria, 27 peças de prata e duas estatuetas chinesas da dinastia Tang, tudo avaliado em US$5 milhões. O crime foi cometido por seis ladrões armados de revólveres. Um deles apresentou uma carteira de policial ao vigia, dizendo que estava à procura de ladrões escondidos nos jardins. Dois dos três andares foram vasculhados pelos criminosos. Duas semanas depois, a polícia conseguiu reaver os quadros. Uma denúncia anônima levou os agentes a um apartamento na Praia de Botafogo. Cinco pessoas foram presas.