Título: Em meio à farra do dinheiro fácil, governo permite empréstimo no cartão
Autor: Henrique Gomes Batista
Fonte: O Globo, 30/04/2006, Economia, p. 32

Ministério da Previdência limita pagamento da fatura mensal a 10% do benefício

BRASÍLIA. Apesar da polêmica sobre o aumento da inadimplência dos idosos, o Ministério da Previdência aprovou na quarta-feira passada uma resolução que vai permitir que os aposentados se endividem ainda mais: o empréstimo consignado em cartão de crédito. Pelo documento, a partir de junho instituições financeiras poderão fornecer cartões aos aposentados, que terão a opção de verem descontados até 10% de seus rendimentos mensais para o pagamento da fatura. Nessa modalidade, ao menos a parcela mínima do cartão será descontada diretamente do contracheque do aposentado.

Essa modalidade de crédito consignado já existiu no ano passado, mas foi suspensa em novembro, para ser aperfeiçoada. Cerca de 500 mil pessoas se associaram no período somente ao cartão criado em parceria com o Sindicato Nacional dos Aposentados.

Em sua página na internet, o ministério divulgou que a nova regulamentação desse cartão vai evitar abusos. Entre as novidades, estão o novo limite de crédito ¿ que não poderá ser superior a duas vezes o total do benefício mensal ¿ e a proibição de cobrança de taxas de emissão e mensalidade e da emissão de mais de um cartão por aposentado.

Sindicato tem cartão com juros de 3,2% ao mês

O ministério não divulgou a data exata do retorno desses cartões ao mercado nem o número de instituições financeiras interessadas em operar com esse novo produto. Em novembro, quando essa linha de crédito foi suspensa pelo governo, apenas duas instituições operavam no segmento. A Previdência não quis falar sobre o assunto.

A volta do cartão de crédito também é controversa, dividindo os próprios aposentados. Enquanto o sindicato nacional da categoria ¿ que já tem um cartão ¿ defende a volta dessa modalidade de crédito, a Confederação Brasileira dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Cobap) se mostra contrária à iniciativa tal como está sendo apresentada.

¿ Defendemos o cartão porque ele dá mais controle aos gastos dos aposentados, é mais utilizado para suas compras cotidianas, como de alimentos e medicamentos, e tem um limite menor de endividamento, de apenas 10% ¿ afirmou Renault de Souza, vice-presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados.

Souza explicou que os juros cobrados nesse cartão são muito inferiores à média do mercado. No caso do cartão do sindicato, os juros estão em 3,2% ao mês. Ele afirma que, em alguns casos, as taxas mensais do cartão de crédito podem chegar a 14%. Ele negou que a instituição, filiada à Força Sindical, receba percentuais da operadora do cartão.

Mais de 5 milhões têm 30% da renda comprometidos

Já o presidente da Cobap, Benedito Marcílio, pondera que o atual formato do cartão só deve piorar a situação do aposentado. Ele explica que, atualmente, mais de cinco milhões deles já comprometem 30% de sua renda com o empréstimo consignado ¿ que poderá ser acumulado com o cartão de crédito.

¿ Queremos discutir melhor esse cartão de crédito. Como o risco de inadimplência é quase zero, acreditamos que os juros devem ser bem menores que os que foram oferecidos no passado. Temos de pensar no interesse dos aposentados, que, muitas vezes, são chefes de família e socorrem membros em necessidades, como amigos e parentes desempregados ¿ afirmou Marcílio.

O presidente da Cobap defende uma ampliação da discussão e quer que apenas os bancos oficiais possam atuar nesse segmento. Marcílio acredita que essa medida garantiria riscos menores de abuso contra os aposentados. Ele explicou já ter verificado diversos casos de abuso nas instituições privadas com relação ao crédito consignado, que cobravam taxas e juros acima daqueles que eram divulgados.