Título: GOVERNO BRASILEIRO NÃO ESPERA SOLUÇÃO RÁPIDA
Autor: Chico Otavio
Fonte: O Globo, 30/04/2006, Economia, p. 35

Visão é que Morales quer manter popularidade e só haveria um acordo dentro de dois meses

BRASÍLIA e TARIJA (Bolívia). O governo brasileiro não tem esperanças de uma solução a curto prazo para o impasse envolvendo a Petrobras e o presidente da Bolívia, Evo Morales. A estimativa do Palácio do Planalto e do Itamaraty é que a estatal e as autoridades bolivianas consigam chegar a um acordo dentro de dois meses. A visão brasileira é que, preocupado em manter os níveis de popularidade, para conseguir aprovar a convocação de uma assembléia constituinte no país, Morales deverá esquentar ainda mais seu discurso contra a exploração dos recursos naturais bolivianos pelas companhias petrolíferas estrangeiras.

Segundo fontes graduadas do governo do Brasil, hoje o que move Morales ¿ que deverá conversar por telefone com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva esta semana ¿ é a situação política, muito mais do que a empresarial. Por esta razão, não será surpresa se ele retomar a carga de ataques sucessivos a empresas estrangeiras, incluindo as do Brasil, avisando que a Bolívia não é ¿terra de ninguém¿. Morales precisa de dois terços do Congresso para aprovar a assembléia constituinte. O sufrágio está marcado para o início de julho.

A Petrobras já avisou que não pretende ser apenas mera prestadora de serviços e que, em caso de expropriação de seus ativos, exigirá indenização na Justiça boliviana. O quadro é delicado, embora seja óbvia a relação de interdependência entre Brasil e Bolívia, o que nos ajuda. Os brasileiros compram 25 milhões de metros cúbicos de gás natural por dia e os bolivianos recebem da Petrobras cerca de US$800 milhões por ano em impostos pagos pela estatal.

Enquanto isso, permanece o elevado grau de dificuldade na negociação entre a Petrobras e o governo boliviano. Embora o termo nacionalização já esteja na lei sobre os hidrocarbonetos, o texto ainda precisa ser regulamentado. E as conversas terão peso importante no formato final da regulamentação.

O governo boliviano esperava ter como interlocutor nesta queda-de-braço com o Brasil o presidente Lula, mas o governo brasileiro procurou mostrar que a Petrobras não é exatamente um órgão da administração federal, mas uma empresa com autonomia, que tem outros acionistas além da União (a estatal tem ações negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo e de Nova York).

As autoridades bolivianas querem esticar a corda até dobrar a resistência da Petrobras. Na época em que os impostos foram elevados de 35% para 50%, eles lembram que a empresa ameaçou abandonar o país, mas a medida foi tomada e a companhia continuou na Bolívia.

Uma das possibilidades cogitadas é estabelecer percentuais diferentes de imposto por poços explorados, aumentando a carga para os poços mais produtivos. A Petrobras, por sua vez, aposta em negociações diferenciadas, empresa por empresa (a espanhola Repsol e a americana Total também exploram o gás boliviano), que ofereçam à estatal brasileira algumas vantagens.

Por enquanto, todos os novos investimentos da Petrobras no país estão parados. A empresa pretende concluir as já iniciadas obras de perfuração do quinto poço em San Antonio, Sábalo V, mas está adiado o projeto de ampliação da unidade de tratamento do gás, que ampliaria em mais um terço sua produção.

(*) Enviado especial

BOLÍVIA VETA MAIS UMA COMPANHIA BRASILEIRA, na página 36