Título: O nacionalismo boliviano se manifesta nos recursos naturais¿
Autor: Chico Otavio
Fonte: O Globo, 30/04/2006, Economia, p. 36

A ameaça de nacionalização da Petrobras Bolívia não pode ser vista como uma questão econômica isolada. Para o economista Gonzalo Chavez, diretor do Mestrado em Desenvolvimento da Universidade Católica da Bolívia (UCB), o debate tem raízes históricas.

Por que a reestatização do gás boliviano se transformou numa questão nacional, discutida por todos?

GONZALO CHAVEZ: É preciso olhar para a história da Bolívia, que até 1985 foi marcada por uma forte participação do Estado na economia. Nos anos 60 e 70, o país chegou a registrar índices de crescimento de 5% do PIB nacional. Havia um contexto externo favorável para a prata, o estanho, o zinco e o ouro. Isso criou na população uma percepção favorável ao nacionalismo.

Se era tão próspero, por que o modelo econômico não sobreviveu?

CHAVEZ: A população apagou da memória os momentos de crise. Entre 1982 e 1984, o país enfrentou uma das piores crises econômicas, com hiperinflação, déficit fiscal e crise do modelo econômico estatista. O déficit fiscal atingiu 25% do PIB e a inflação, 11.000% ao ano, com desemprego. Em 1985, Victor Paz Estenssoro ganhou a eleição presidencial pela quarta vez e implementou o modelo neoliberal. Em 1993, o primeiro governo de Gonzalo Sanches de Lozada aprofundou as reformas na linha neoliberal e promoveu a estabilização e a redução do déficit público. Partiu para um amplo programa de privatização das estatais e atraiu a Petrobras.

O que aconteceu com este modelo? Também fracassou?

CHAVEZ: Em 20 anos de democracia, houve avanços significativos. Mas os partidos políticos criaram alianças que se degeneraram na divisão do poder político e que começaram a se afastar da sociedade. Os movimentos sociais criaram organizações e combateram a ordem estabelecida. Agora, o nacionalismo boliviano se manifesta nos recursos naturais. (Chico Otavio)