Título: Bolívia veta mais uma companhia brasileira
Autor: Chico Otavio
Fonte: O Globo, 30/04/2006, Economia, p. 36

Orbisat Amazonas, que desenvolvia softwares para o governo e investiu mais do que EBX, tem licença cassada

LA PAZ (Bolívia). A EBX, siderúrgica do empresário Eike Batista, não foi a única empresa brasileira proibida pelo governo boliviano de operar no país. Por razões ainda desconhecidas pela diplomacia brasileira, a administração do presidente Evo Morales vetou igualmente a licença de funcionamento da Orbisat Amazonas, cujos investimentos na Bolívia superaram os da EBX.

Contratada pelo governo anterior, a Orbisat estava desenvolvendo um software para o aerolevantamento da faixa de fronteira da Bolívia, com investimentos estimados em US$53 milhões. Para quem acompanhou o caso, seria uma vingança do atual governo contra os empresários que celebraram negócios com a gestão anterior, do ex-presidente Carlos Mesa.

O mais recente litígio reforçou o clima de incerteza sobre o futuro dos negócios brasileiros na Bolívia. Dois setores estão acompanhando atentamente o desenrolar da crise: o dos fazendeiros brasileiros que plantam soja no leste do país, principalmente no Departamento de Santa Cruz; e o das empreiteiras Norberto Odebrecht e Queiróz Galvão, responsáveis pela construção de rodovias na Bolívia.

Fazendeiros temem reforma agrária e desapropriação

Como o país terá eleições em julho para uma Assembléia Nacional Constituinte, os empresários do setor de soja temem os eventuais efeitos, em seus negócios, de uma reforma agrária ampla nas valorizadas terras baixas da Bolívia. Recentemente, o Movimento ao Socialismo (MAS), do presidente Evo Morales, denunciou a presença de 500 proprietários de terras brasileiros em território boliviano, na faixa de fronteira, o que é vetado pela atual Constituição.

A situação mais grave, até agora, é a da siderúrgica EBX. O presidente boliviano, Evo Morales, faz críticas abertas à empresa e declarou publicamente que a expulsaria do país. O vice-presidente, Álvaro García Linera, reforçou o discurso e garantiu que ¿o governo não negociará sob nenhuma circunstância a permanência da EBX¿.

¿ É uma empresa ilegal que violou nossas leis e deve sair do país ¿ disse Linera.

Acuado, o dono da EBX, Eike Batista, já havia decidido retirar-se do país, tentando salvar os seus equipamentos, quando soube que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria considerado ¿inaceitáveis¿ as pressões contra as empresas brasileiras na Bolívia. A posição do presidente reavivou as esperanças de concluir a siderúrgica.

Assessores de Batista explicaram que o governo tem uma rixa com os sócios bolivianos do brasileiro, acusados de apoiar o governo anterior. A planta industrial da EBX, que consumiu US$60 milhões em investimentos, já conta com um alto-forno completo e outro praticamente concluído. Ao saber que Batista pretendia desmontá-los e retirá-los da Bolívia, Morales chegou a ameaçar com expropriação.

A empresa alega que cumpriu todos os trâmites legais antes de instalar-se em território boliviano e estaria disposta a permanecer no país desde que as condições para isso fossem colocadas de maneira mais clara pelo governo. A licença ambiental, alega, foi pedida em 17 de maio de 2005, mas o governo boliviano nunca respondeu.

Na tentativa de reduzir a tensão entre os dois lados, o governo brasileiro enviou ao país vizinho, na semana passada, uma missão de cooperação chefiada pelo ministro Samuel Guimarães, secretário-geral do Ministério das Relações Exteriores, segundo posto mais importante do Itamaraty, e composta por cerca de 30 técnicos.

O Brasil está oferecendo ajuda à Bolívia em áreas estratégicas, como programas de alfabetização, ensino superior, diagnóstico de saúde na fronteira, capacitação técnica (Senai), combate à febre aftosa, medicação contra o HIV, culturas alternativas na região do Chapare (onde ficam as plantações de coca), recursos hídricos e florestais e revisão constitucional.