Título: RÚSSIA RENOVA SEU CONTROLE SOBRE A ECONOMIA
Autor: Andrew Kramer e Steven Les Myers
Fonte: O Globo, 30/04/2006, O Mundo, p. 46

Detentora do monopólio estatal de gás e quinta maior empresa do mundo, Gazprom serve aos interesses do Kremlin

KRASNAYA POLYANA, Rússia. Aqui no Cáucaso, acima de Sochi, a única cidade subtropical da Rússia, uma estação de esqui de elite está sendo erguida ao lado do Rio Layura. A estação, um projeto multimilionário com um hotel e um centro de conferências, cabanas, seis elevadores e quilômetros de trilhas, é o centro da improvável candidatura de Sochi para sediar as Olimpíadas de Inverno de 2014. Ainda mais improvável é o responsável pelo desenvolvimento do projeto: a detentora do monopólio estatal de gás da Rússia, a Gazprom.

Companhia é avaliada em US$240 bilhões

A companhia é uma vasta e poderosa gigante da energia avaliada em mais de US$240 bilhões. Avaliada pelo tamanho de suas reservas, a Gazprom é a quinta maior companhia no mundo, tendo em 2005 ultrapassado o Wal-Mart, a Toyota e o Citigroup. Seus executivos já prometeram torná-la a maior.

Ela se tornou algo mais também: o principal modelo de um capitalismo russo que emergiu desde que o presidente Vladimir Putin chegou ao poder em 2000. É um sistema econômico construído cada vez mais em torno de estatais ou de companhias orientadas pelo Estado abertas aos dólares e aos euros dos investidores, mas que permanecem rigidamente controladas ¿ como boa parte dos negócios e da política ¿ pelo Kremlin.

Como mostra o projeto em Krasnaya Polyana, a Gazprom não é apenas um monopólio estatal lucrativo, mas também um poderoso instrumento das políticas do Kremlin em casa e no exterior. Ela desenvolveu projetos que têm pouco a ver com seus interesses corporativos estabelecidos, mas muito a ver com política: da candidatura a sede olímpica à compra acionária de imprensa independente, da sustentação de fazendas não-lucrativas a subsídios a indústrias com energia barata.

Ela também tem sido o centro da política externa russa, usada como um garrote na recente disputa por preços de gás com a Ucrânia e outros vizinhos. Seu executivo-chefe, Alexei Miller, recentemente advertiu a Europa a não bloquear sua expansão para os mercados do continente, para que a companhia não decida vender seu gás natural em outras paragens.

Críticos falam de favorecimentos a aliados

Andrei Illarionov, um ex-assessor econômico de Putin que se tornou seu crítico depois de sua demissão, chamou a economia da Rússia hoje de uma forma de ¿Estado corporativo¿. Ele descreveu um séquito de altos funcionários que controlam os grandes negócios por meio de seus postos no governo, usando sua influência para fazer não apenas política, mas lucros. Alguns têm duas posições: o presidente da Gazprom é Dmitri Medvedev, ex-chefe de Gabinete do Kremlin, atual primeiro vice-premier e um homem amplamente considerado um possível sucessor de Putin. Críticos dizem que o Kremlin não está renacionalizando indústrias vendidas nos anos 1990, mas redistribuindo seus bens entre um novo grupo de magnatas, enriquecendo investidores favorecidos e até membros do governo, enquanto assegura sua influência sobre a parte mais importante da economia.