Título: CHÁVEZ E TOLEDO EM PÉ DE GUERRA
Autor: Janaina Figueiredo
Fonte: O Globo, 01/05/2006, O Mundo, p. 19

Bate-boca sobre o processo eleitoral peruano abre uma grave crise diplomática

Em meio ao tumultuado processo eleitoral peruano, os governos dos presidentes Alejandro Toledo e Hugo Chávez, da Venezuela, mergulharam numa crise diplomática que promete provocar um clima de instabilidade política na região. Um dia depois de o governo peruano retirar seu embaixador em Caracas, o ministro do Exterior da Venezuela, Ali Rodríguez Araque, disse ontem que seu país não agirá de maneira recíproca. O conflito foi desencadeado por uma troca de agressões entre Chávez e o ex-presidente peruano Alan García (1985-1990) que, segundo dados oficiais preliminares, disputará o segundo turno das eleições presidenciais com o líder nacionalista, Ollanta Humala, que conta com o apoio explícito de Chávez.

As divergências entre os governos Toledo e Chávez começaram em janeiro, com as primeiras declarações do presidente venezuelano a favor da candidatura de Humala (chamado por Chávez de ¿Quixote peruano¿ por ter comandado um levante militar contra o governo de Alberto Fujimori), durante uma visita do candidato a Caracas. O presidente da Venezuela demonstra verdadeiro ódio a García, amigo do ex-presidente venezuelano Carlos Andrés Pérez, vítima de uma tentativa de golpe de Estado em 1992 liderada por Chávez, na época tenente-coronel. A rixa entre os dois chegou ao auge semana passada, quando Pérez chamou Chávez de sem-vergonha por ter exigido que os governos do Peru e da Colômbia renunciem ao Tratado de Livre Comércio com os EUA, como condição para que seu país não abandone a Comunidade Andina de Nações. Sexta-feira, Chávez disse que se García for eleito presidente, seu governo retirará de Lima o embaixador venezuelano.

¿ Não teremos relações com um presidente dessa categoria ¿ assegurou.

Comércio com os EUA no centro da discussão

No dia seguinte, o governo Toledo enviou a Caracas uma carta de protesto contra a interferência de Chávez no processo eleitoral peruano. Em tom diplomático, a chancelaria venezuelana respondeu que ¿o governo tem o legítimo direito a responder a agressões grosseiras¿. Bem menos cauteloso, Chávez chamou García (já processado por corrupção) de ¿corrupto, sem-vergonha e ladrão¿ e criticou Toledo por defendê-lo. A atitude do presidente venezuelano levou o governo peruano a retirar seu embaixador na Venezuela.

¿ Respondo a quem se meter comigo ¿ disse Chávez num encontro com seus colegas de Cuba, Fidel Castro, e da Bolívia, Evo Morales, em Havana.

Ontem, Morales convidou Humala para visitar a Bolívia.

O presidente venezuelano afirmou que apenas se defendeu dos ataques de García.

¿ Ele me chamou de sem-vergonha e eu nada dissera a esse senhor. Sequer o havia mencionado. Mas como a candidata da oligarquia peruana e do império, Lourdes Flores, não passou (para o segundo turno), agora ele está assumindo a candidatura do império ¿ alfinetou Chávez.

Ontem, García contra-atacou:

¿ Chávez tem uma dupla moral e insultou o povo peruano ao se meter na política do país.

García questionou o fato de Chávez criticar a assinatura de acordos comerciais com os EUA e continuar vendendo petróleo para o mercado americano.

¿ A maior refinaria da Louisiana pertence à Venezuela. Caracas mantém um relacionamento privilegiado com o governo do presidente George W. Bush e pretende que outros países não assinem acordos comerciais ¿ disse García.

Humala até o momento não se pronunciou sobre a crise.