Título: Onda nacionalista ameaça integração regional
Autor: Patricia Duarte
Fonte: O Globo, 02/05/2006, Economia, p. 21

Analistas alertam para risco a investimentos e ao desenvolvimento da América Latina devido ao rumo político

BRASÍLIA. A integração regional latina, sobretudo na América do Sul, parece cada vez mais distante com a onda nacionalista em diversos países locais, que pode ainda afugentar investimentos de outras regiões. Tendo como o maior exemplo o presidente venezuelano Hugo Chávez, governos sul-americanos vêm endurecendo discursos e posições em defesa da produção local, que muitas vezes acabam se sobrepondo às relações internacionais. Na avaliação do professor de ciência política da Universidade de Brasília (UnB) David Fleischer, esse quadro não é positivo porque retarda a união das economias e dificulta o desenvolvimento.

¿ O nacionalismo atrapalha a integração regional e isso é ruim porque ficamos parados no tempo ¿ afirma Fleisher.

O nacionalismo na região pode ser visto em diversos países e por diferentes focos. A estatal brasileira Petrobras serve como exemplo porque seus investimentos correm risco tanto na Bolívia, com a nacionalização feita ontem pelo presidente Evo Morales, quanto no Equador, onde a estatal está no fio da navalha porque seus contratos podem ser alterados, elevando a parcela do governo local nos lucros.

Argentina e Uruguai também andam se bicando por conta da construção de duas fábricas de celulose na fronteira entre os dois países. As unidades estão sendo erguidas nas margens do rio Uruguai, recurso natural partilhado pelos dois países. Segundo a mídia do Uruguai, o país já pensa em deixar de ser membro do Mercosul para ficar apenas como associado.

Os embates econômicos na região, lembra o professor da UnB, têm sido a grande característica neste momento, diferentemente do início do século passado e da época dos regimes militares, quando houve até mesmo confrontos, o que não parece ocorrer agora. O atual cenário de ano eleitoral, avalia ele, deixa o governo do presidente Lula mais vulnerável para assumir o papel pretendido de grande liderança regional. Neste momento, usar muito a força diplomática nas questões internacionais pode servir de vidraça para o oposição.

¿ O governo brasileiro tem condições de assumir a função (de líder) apenas a partir de 2007. Agora, terá de negociar muito para resolver seus problemas ¿ avalia.

Além de afetar os investimentos já feitos, a postura nacionalista pode afugentar também novos desembolsos, sobretudos de empresas estrangeiras. O consultor internacional Adimar Schievelbein acredita que países com posturas mais radicais ¿ como a Bolívia e a Venezuela ¿ já devem estar sentindo o desinteresse dos investidores, mas teme que o efeito respingue aqui.

¿ O exemplo que estão dando é que pode contaminar outros países, como o Brasil ¿ argumenta o consultor, para quem a saída para a região será a negociação diplomática.