Título: OS FRACASSOS DO MULTILATERALISMO DE BUSH
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Fonte: O Globo, 02/05/2006, O Mundo, p. 25

Muita gente fala que o presidente Bush, tendo aprendido com os erros de sua política externa unilateral no primeiro mandato, adotou uma maneira mais multilateral de lidar com o assunto no segundo. A secretária de Estado, Condoleezza Rice, tem cooperado com os aliados de uma forma que não foi permitida pela linha-dura a seu predecessor, Colin Powell. Sobre os maiores desafios mundiais, ela construiu coalizões e buscou agir através de organizações internacionais.

Mas quais foram os resultados deste ¿multilateralismo¿ até agora? Se se entende resultados por conquistas reais, deve-se dizer: no Irã, nenhum; na Coréia do Norte, nenhum; em Mianmar, nenhum; em Darfur, nenhum.

Como seus críticos multilateralistas pediram, o governo neste segundo mandato deu apoio aos ¿três da UE¿ ¿ Reino Unido, França e Alemanha ¿ na negociação com o Irã. O resultado? O Irã não apenas avançou em seu programa nuclear como prometeu abertamente proliferar a tecnologia nuclear para regimes perigosos.

Na Coréia do Norte, o governo se uniu às conversações dos seis países ¿ China, Japão, Rússia, as duas Coréias e os EUA. O programa de armas nucleares da Coréia do Norte também está, até onde é possível saber, avançando.

Em Mianmar, o governo exortou a ONU e outras organizações a pressionar por reformas. Os resultados? Só nos últimos dois meses uma cada vez mais rápida campanha de limpeza étnica deslocou mais de 11 mil pessoas. E em Darfur, os EUA apoiaram a diplomacia e as forças de paz da União Africana. O genocídio continua.

É claro, estes são relatos feitos na metade do segundo mandato, não notas finais. Em alguns destes casos, a ação multilateral ainda pode dar frutos. Além disso, os resultados desapontadores em parte refletem a arrogância e o desdém que o governo tinha anteriormente por seus aliados; e os danos causados por tais atos não são rapidamente esquecidos.

Mas mesmo assim pode ser útil examinar as frustrações de recentes esforços de aliados.

O fundamento para a ação multilateral é que outros países, com um pouco de persuasão, acabarão entendendo que seus interesses convergem com os nossos. Certamente, dizem autoridades americanas, a Rússia não pode querer que mulás malucos ao sul de seu país tenham a bomba! É claro que a China ficaria nervosa em ver armas nucleares nas mãos de Kim Jong-il. Certamente a França deve estar inquieta em ver milhares de civis estuprados e mortos em Darfur perto de suas bases no Chade.

Ainda assim a França não parece perturbada. A China parece mais satisfeita com um vizinho stalinista com armas nucleares do que com os riscos de qualquer regime alternativo. Tanto China quanto Rússia podem dar mais atenção a seu acesso ao petróleo iraniano do que em ter de interromper o programa nuclear de Teerã, que eles acreditam não ser voltado contra elas próprias. Mesmo quando os interesses são convergentes, os países relutarão a sacrificar vantagens de curto prazo por ganhos nebulosos ou incertos de longo prazo.

Assim, sem a liderança dos EUA num lugar como Darfur, o mais provável é que nada aconteça. Isso pode explicar porque muitos dos que criticavam o governo por ele não apoiar suficientemente a diplomacia européia com o Irã agora criticam o governo por não negociar diretamente com o regime iraniano. De forma unilateral.

O multilateralismo não é uma panacéia. Mas, em alguns casos (Afeganistão), funciona. Em muitos casos, não há alternativa. Em Darfur, o multilateralismo está fracassando, mas uma intervenção unilateral dos EUA poderia ser desastrosa.

FRED HIATT é colunista do jornal ¿Washington Post¿