Título: Petrobras diz não a Morales
Autor: Ramona Ordoñez
Fonte: O Globo, 04/05/2006, Economia, p. 27

Estatal recusa reajuste de preço de gás da Bolívia e suspende investimentos

APetrobras, maior empresa da Bolívia e responsável por quase 20% do Produto Interno Bruto (PIB) do país, reagiu duramente ao decreto boliviano que, no dia 1º, estatizou as reservas petrolíferas e as companhias do setor em seu território. O presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, anunciou que a estatal brasileira não vai aceitar aumento de preços do gás natural importado do país vizinho e pode recorrer tanto à Justiça da Bolívia quanto à internacional ¿ por exemplo, Nova York. Além disso, a Petrobras suspendeu todos os planos de investimentos na Bolívia, incluindo o aumento das importações de gás do país.

A estatal ¿ que já investiu cerca de US$1 bilhão na Bolívia ¿ previa, além do contrato que permite importações de até 30 milhões de metros cúbicos de gás natural por dia, comprar mais 15 milhões diários até 2015. Atualmente, o Brasil compra dos bolivianos metade do gás natural que consome. Em substituição ao aumento das importações da Bolívia, a Petrobras vai desenvolver um projeto para importar gás natural líquido (GNL).

¿ Nós não fomos ainda formalmente notificados (sobre aumentos de preços), mas se isso acontecer somos contra ¿ afirmou Gabrielli.

Em entrevista a uma rádio local, o presidente da estatal Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB), Alvarado Rivas, garantiu que o fornecimento de gás a Brasil e Argentina será mantido. Mas ele insistiu que o preço será aumentado:

¿ Sabemos que estamos vendendo a um preço muito baixo com relação ao valor internacional.

Contrato obedece leis internacionais

Para analistas políticos bolivianos, as reações consideradas tímidas do Brasil devem encorajar as autoridades do governo Evo Morales a impor ao Brasil um preço elevado para o gás. Na mesa de negociações, o único trunfo do Brasil é responder pela compra de mais de 70% do gás da Bolívia. O corte das compras quebraria a Bolívia em poucas semanas, mas a possibilidade não está cogitada porque levaria o Brasil ao racionamento de gás em ano eleitoral.

O presidente da Petrobras explicou que o contrato de importação do gás da Bolívia foi assinado com a estatal YPFB em 2000. Segundo o executivo, as mudanças anunciadas atingem atividades de produção, não o contrato de exploração de gás para o Brasil.

Gabrielli explicou que o contrato de importação de gás boliviano tem como fórum Nova York. Se for necessário, ressaltou, a Petrobras vai recorrer à arbitragem internacional para defender seus direitos. Segundo ele, em 2003 a Petrobras solicitou uma redução nos preços à Bolívia porque pagava por 24 milhões de metros cúbicos por dia enquanto consumia apenas 12 milhões, por falta de mercado. A Bolívia negou o pedido.

O presidente da Petrobras não cogita a hipótese de a Bolívia cortar o fornecimento para o Brasil, porque, além de ser importante fonte de receita, impediria a produção dos combustíveis consumidos no país, uma vez que o gás é associado ao petróleo:

¿ Não há qualquer possibilidade de apagão de gás neste país. É pura especulação irresponsável.

Para aumentar a produção interna de gás, a Petrobras prevê investimentos de cerca de US$18 bilhões nos próximos anos na Bacia de Santos. O campo gigante de Mexilhão, em Santos, vai começar a produzir 12 milhões de metros cúbicos de gás por dia em 2008.

Entre os projetos suspensos na Bolívia está o aumento das importações de gás. Para substituir as importações, a Petrobras já iniciou estudos para a compra de gás na forma líquida, o GNL. O produto vem transportado em navios especiais e é regaseificado em uma unidade industrial normalmente construída próxima a um porto. A Petrobras estuda a possibilidade de importar até seis milhões de metros cúbicos por dia de GNL para o Nordeste e outros 14 milhões de metros cúbicos para o Sudeste.

COLABOROU Chico Otavio (enviado especial), com agências internacionais